FIM DE SEMANA EM FAMÍLIA
(I)
O sinal fica vermelho. Maurício esvazia a garrafa de água. Augusto ressona.
- Será que eles vão gostar de mim?
- Claro que sim.
- Eles são crentes né...?
- É, são sim.
- Ai, ai, não vou aturar desaforo.
- Que isso Maumau...
- Não me chama assim!
- Você fica tão fofo quando está preocupado, Maumau.
- O sinal abriu.
- Meus pais são tranquilos Maurício, só vão querer que você recite os dez mandamentos.
- O quê? Para de brincadeira.
- É sério.
- Quais são mesmo? Honrar pai e mãe... não desejar a mulher do próximo...
- No nosso caso o homem da próxima.
- Augusto, por favor, não brinque comigo.
- Ai amor é que você se preocupa demais.
- Eles são meus sogros né.
- E daí? Eles não mordem.
- Tenho medo de meter os pés pelas mãos.
- Relaxa.
Um casal espera no passeio de uma casa de dois andares. Augusto estaciona.
A mulher sussurra ao homem.
- Seja gentil.
- Não começa.
- Você prometeu.
Eles erguem as mãos acenando.
- Ele é meu filho.
- E o outro seu genro.
- Genro... genro... sei...
- Larga de nojeira Gilson.
- Fica quieta Marisa.
Augusto abre a porta do carro espera por Maurício, e pega em sua mão.
Gilson morde a língua e tira a mão esquerda de dentro do bolso.
Augusto abraça a mãe. Maurício aperta a mão de Gilson.
- Olá, prazer, sou Maurício.
- Seja bem vindo.
Augusto abraça ao pai e o beija nas bochechas o velho fica da cor do semâfaro.
- Vem cá, - diz Marisa. - Como você é lindo!
Ela abraça-se a Maurício e o beija na bochecha.
- Opa, melei você, venha, entre, se sinta em casa.
Maurício olha por cima do ombro para Augusto que conversa com o pai.
A casa em dois pavimentos tem a sala de estar no primeiro.
- Quem são?
Maurício pergunta apontando para um porta retrato.
- Ah, Augusto e a irmã Elisa, e o outro...
Augusto chega por trás e abraça os ombros de Maurício e Marisa.
- Quem vai vir? Elisa e os meninos?
- Ela prometeu aparecer.
Maurício volta a olhar para o porta retrato.
- Alguém pode me ajudar aqui?
Gilson grita atrás carregando as malas. Maurício vai até ele e pega uma parte.
- Augusto! - ele chama.
- Deixa isso aí, papai é apressado, eu disse que pegava.
- Você, você, esse daí se deixar não faz nada.
Gilson cafunga mordendo os lábios.
- Ele é desatento mesmo.
Maurício e Gilson se olham concordando.
- E bagunceiro.
- Exatamente!
- Ah estão unidos contra mim? - Augusto sorri com as mãos na cintura.
E os deixa.
Maurício aproveita a oportunidade e indaga:
- Quem é o outro rapaz nessa foto?
Gilson ocupado com as malas olha por cima do ombro e responde:
- Ícaro.
- Não sabia que Augusto tinha outro irmão.
- Irmão? Era o namorado dele. Deu uma dor de cabeça...
A notícia caiu como uma pedra em cima da cabeça de Maurício que largou a mala.
"Ele devia ser especial para manterem uma foto ali". Não pensou em mais nada.
Na primeira oportunidade a sós com Augusto perguntou.
- Ícaro né?
- Ah você viu.
- Tem como não ver na entrada da sala?
- É, meus pais eram fãs dele, - Augusto responde irónico.
- Você nunca me contou desse Ícaro.
- Ele morreu. Foi por isso.
Maurício recebe uma nova pedrada no alto da cabeça.
- Nossa amor. Foi mal.
- Tá tranquilo. Agora.
O barulho do chuveiro foi a única coisa que barulhou por minutos.
- Você o amava? - Maurício não resiste.
Augusto estava com a toalha na cintura e penteava os cabelos.
- Sim, - ele suspira. - Eu pensei que ficaríamos juntos pelo resto da vida.
Maurício segura as lágrimas que sobem para seus olhos. Morde os lábios e suspira.
- Ele morreu como?
Novo suspiro. Augusto caminha até Maurício e senta-se ao seu lado.
- É uma história longa.
- A gente tem tempo a não ser que isso te machuque...
Augusto move a cabeça de um lado para o outro.
- Ele cometeu suicídio.
- Minha nossa Augusto!
- Sim. Foi pesado.
- Por quê?
A voz de Marisa rompe a conversa dos dois chamando-os para o almoço.
O frango assado e o molho estão no ar.
O cheiro faz o estomago de ambos roncar e eles sorriram um para o outro.