O Internato – XXX
Capitulo trinta
What do You Got
Ian
– O que ele faz aqui? – indaguei ao entrar no carro de meu padrasto.
Pedrinho dormia profundamente no banco traseiro segurando seu boneco preferido do Bem 10. Sua expressão serena me dizia que nada tinha acontecido. Nada ainda tinha acontecido.
– Pensei em levar os dois para dar uma volta – Jair deu um sorriso malicioso que me assustou. Se inclinou para mim e me deu um beijo forçado.
– Para! – disse tentando me afastar, mas era praticamente impossível. Jair era muito mais forte do que eu.
Ele me largou mantendo seu sorriso sádico e arrancou com o carro. Dirigiu por aquela estrada ladeada apenas por uma vegetação densa até que finalmente chegou a Petrópolis. A cidade adormecia silenciosamente. O palácio de cristal estava esplendidamente iluminado.
Jair pois a mão direita sobre a minha coxa esquerda e começou a acaricia-la. Meus olhos instintivamente se lançaram para o espelho retrovisor no teto do carro onde eu podia ver meu irmão adormecido.
– Você fica lindo com essa camisa do Batman – ele falou em um sussurro pervertido. Ele passou as costas na mão nojenta em meu rosto.
– Eu a odeio – disse cuspindo as palavras com uma mistura de raiva e dor. E odiava mesmo, pois foi ele quem me dera para me fazer parecer mais infantil.
Ele apenas riu e tirou as mãos de cima de mim. Jair se embrenhou pela cidade até parar na frente de um hotel vagabundo onde a placa de neons tinha várias das letras queimadas. Meu coração veio a boca, pois naquele momento eu percebi o que ele queria fazer.
– Seu desgraçado! – disse começando a lhe bater – O que você vai fazer com ele?
Mas apesar dos meus inúmeros golpes Jair não se abalava. Era como se eu fosse novamente uma criança de nove anos tentando bater em um monstro de pedra. Meu padrasto parou no estacionamento do hotel e saiu do carro me deixando trancado no carro com meu irmão.
– Pedrinho? – comecei a sacodir meu irmão que dormia profundamente – Acorda Pedrinho!
– O que? – ele indagou com a voz sonolenta. Ele esfregou os olhos tentando espantar o sono – Ian?
– Me escuta, Pedrinho – disse me jogando no banco de trás ao seu lado e soltando o sinto de segurança para que ele ficasse livre da cadeirinha – Quando Jair voltar, nós precisamos correr.
– Mas o papai disse que a gente ia se divertir – meu irmão resmungou cruzando os braços e fazendo beicinho.
– Ele mentiu, Pedro – disse acariciando os cachos negros de meu irmãozinho – Ele quer te machucar! Do mesmo jeito que ele me machucou.
– O papai é bom – ele insistiu – Disse que me levaria a um lugar divertido e que nós brincaríamos a noite toda.
Era incrivelmente irritante a inocência e a confiança de meu irmãozinho. Pedro era apenas uma criança pequena que acreditava em tudo aquilo que os adultos lhe falavam. Com toda a certeza do mundo, não havia lhe passado pela cabeça nada daquilo que Jair estava tramando fazer contra ele.
– Ele não é, Pedrinho – disse entrando em desespero – Confie em mim!
– Papai disse que você é mau – disse me surpreendendo – Disse que você quer me enganar para me machucar.
– O que? – disse começando a chorar – Acredite em mim, Pedrinho! – disse segurando seus ombros.
Meu irmão parecia completamente assustado com meu descontrole, mas não emitiu nenhum som. Aquele desgraçado tinha posto meu irmãozinho contra mim. Ele mentiu descarada ente para Pedro e o aterrorizou. Eu sabia que ele era doente, mas ele me surpreendia a cada instante.
A porta do carro se abriu e senti mãos fortes segurando meu braço. Jair me puxou para fora me fazendo cair no chão. Ele me levantou com brutalidade e começou a me puxar em direção a entrada do hotel.
– O nosso quarto já está pronto – ele dizia com felicidade.
– Me larga! – eu gritava desesperado me debatendo contra Jair – Eu vou te matar seu filho da puta!
Pedrinho saiu do carro e saltitava ao nosso lado segurando o boneco do Bem 10 em suas mãos. Não havia mais aquele olhar de pânico em seus olhos e sim um olhar contente como sempre vi em seu rosto. Ele olhava para mim como se me visse caminhar normalmente e não ser arrastado por um maníaco. Maníaco que até aquele dia nunca tinha me machucado daquela forma. Jair era o tipo de homem que usava as palavras e não força bruta para conseguir o que queria. Mas aquele homem diante de mim parecia completamente transformado como se sua loucura interior finalmente tivesse assumido o controle de seu corpo e comandasse todas as suas ações. Meu padrasto era um homem cuidadoso ao extremo quando abusava de mim. Nunca me arrastaria pelo braço até um hotel fuleiro no meio da noite junto de meu irmão mais novo enquanto eu gritava e me debatia. Aquela criatura não parecia Jair.
Passamos pela recepção do hotel onde um rapaz sorridente nos indicou onde ficava o elevador. Seus olhos eram vagos como se ele estivesse hipnotizado.
– Socorro! – gritei para o rapaz.
– Tenha uma boa noite! – ele disse sem parecer perceber que eu estava sendo forçado aquilo.
Jair chamou o elevador que chegou em menos de dez segundos. Ele me jogou para dentro daquele cubículo apertado e entrou em seguida com Pedrinho em seu encalço. Olhei o mostrador do elevador e vi que paramos no segundo andar. A porta se abriu e Jair me segurou pelos cabelos para me arrastar. A dor era excruciante e me fazia gritar. O mais bizarro era que meu irmão mantinha o mesmo sorriso alucinado de antes. Por que ninguém conseguia ver o que ele fazia comigo?
Jair parou em frente ao quarto 217 e abriu a porta. Era um quarto pequeno com uma pequena varanda cuja porta estava aberta e o vento frio entrava no quarto fazendo as cortinas esvoaçarem. Jair me atirou para dentro do quarto com muita brutalidade. Bati o ombro em uma cômoda de madeira com tanta força que a televisão em cima dela sacolejou e quase caiu em cima de mim. Pedrinho correu até a cama e pegou um par de algemas que estavam repousadas sobre o travesseiro por algum motivo. Ele as ergueu para o pai com que a pegou. Ele Veio até mim novamente e prendeu meu pulso direito na grade que da sacada me dando uma visão completa do quarto e da rua deserta abaixo.
– Você pode gritar, mas ninguém vai te escutar – Jair falou com um tom de voz que denunciava completamente sua insanidade.
– Socorro! – tornei a gritar olhando para a rua – Alguém me ajude!
Jair caiu na gargalhada. E se voltou para Pedrinho que estava sentado na beira da cama abraçado ao boneco do Ben 10, mas ao contrário do que tinha visto a apenas dois segundos, ele não sorria. Em seu rosto havia uma expressão de pânico e algumas lágrimas escapavam por seus olhos.
– O que você vai fazer papai? – meu irmãozinho choramingou.
Jair se aproximou dele sorrateiramente. Abriu a fivela do sinto e o tirou deixando-o cair sobre o chão de madeira. Sentou-se ao lado de Pedrinho que tremia e acariciou seu cabelo cacheado de uma forma que os pais nunca deveriam fazer com seus filhos.
– Larga ele! – gritei tentando me soltar, mas a algema era muito forte – Seu filho da puta! Larga ele!
A algema começou a rasgar minha pela à medida que eu me debatia desesperadamente.
– Vai ficar tudo bem – Jair disse ao pé do ouvido de Pedrinho – Papai te ama muito.
Ele tirou o boneco da mão de Pedrinho e o deitou na cama repousando seu corpo sobre o do meu irmão. Seus lábios começaram a beijar o pescoço de Pedrinho que não se mexia. Apenas deixava que as lágrimas lhe escapassem pelos olhos. Jair sorria satisfeito quando beijou a boca de Pedro que foi forçado a retribuir.
– Solta ele! – eu chorava puxando o meu pulso que agora sangrava devido aos cortes feitos pela algema – Solta ele seu desgraçado!
Ele olhou para mim e sorriu de forma demoníaca. Começou a abrir os botões de sua camisa e a retirou mostrando aquele corpo fora de forma e peludo. Ele deslizou a mão grande e asquerosa sobre o corpinho de Pedro e tirou sua camisa. Ele começou a beijar o corpo infantil de meu irmãozinho de forma doentia e nojenta.
– Isso é culpa do Ian – ele sussurrou para Pedrinho que apenas choramingava – Ele cresceu enquanto você continua pequeno e gostosinho.
Os olhos de Pedrinho se cruzaram com os meus e eu pude ver um olhar acusador misturado com o pânico e a dor.
– Me desculpa! – disse chorando horrores.
Jair tirou o short de Pedrinho e o virou de bruços. Abriu a própria calça e a retirou revelando seu membro rígido que infelizmente eu conhecia muito bem. Ele o introduziu com violência no cu de Pedrinho que começou a se debater e a gritar desesperado.
“Abra a porta”
Escutei em meio aos gritos de dor de meu irmão. Olhei para a porta do quarto e não havia nenhuma alteração nela. Meus olhos se voltaram para meu irmão que chorava e se debatia.
“Abre logo essa porta!”
Ouvi de novo. Jair segurou a cabeça de Pedrinho contra a cama da mesma forma que Izac tinha feito comigo quando me estuprou pela primeira vez. Então tudo ficou estranho e nebuloso. De repente era como se o quarto, meu irmão e o monstro que estava por cima dele fossem feitos de fumaça. Eles se dissolviam e então voltavam a formar pessoas.
...
– Ian! Abre logo essa porta se não vou chegar atrasado na aula! – acordei com a voz de Lucas. Ele esmurrava a porta fazendo-a tremer.
Me levantei no chão do banheiro feliz por ainda estar em meu quarto no colégio imperial. Olhei em meu celular e percebi que aquela ligação de Jair não passava de um pesadelo horrível. Abri a porta do banheiro e Lucas me esperava a porta. Sua expressão indicava que ele não estava afim de conversa.
– Da próxima vez vá chorar em outro lugar! – ele resmungou passando por mim – Não posso me atrasar para a aula de história.
– Vai encher o saco de outro! – passei por ele fazendo questão de bater nele com meu ombro.
Sai do quarto batendo a porta ao passar. Peguei meu telefone do bolso da calça e disquei o número de casa. Não demorou muito para que ela atendesse o telefone.
– Bom dia querido! – minha mãe estava radiante ao telefone – Aconteceu alguma coisa? Você nunca liga!
– Me deixa falar com Pedrinho! – disse desesperado.
– Tudo bem, mas aconteceu algo? – agora era ela quem estava preocupada.
– Me deixa falar com ele! – quase gritei no telefone.
Ouvi minha mãe chamando por Pedro do outro lado da linha. Não demorou muito para que ele pegasse o telefone.
– Oi, Ian! – ele disse com aquela sua vozinha de criança feliz.
– Oi, maninho – não consegui conter as lágrimas ao perceber que ele estava bem – Como você está?
– Bem – falou animado – A mãe do Davi levou a gente no cinema para ver o filme dos Minions. A gente comeu pipoca e refrigerante! O Davi derramou refrigerante da blusa dele. Foi muito engraçado!
Sorri com a história dele.
– Que bom que se divertiu – disse fungando – Mas você promete uma coisa para o irmão?
– Prometo! – ele disse eufórico.
– Se alguém te machucar você vai correndo me contar – falei – Seja quem for. Papai ou Izac! Está me ouvindo?
– O Izac pisou no meu pé ontem à noite – ele contou – Doeu muito!
– E o papai? – indaguei preocupado – Ele tocou em você ou fez algo de diferente? Algo estranho?
– Estranho? – ele parecia confuso.
– Ele tirou sua roupa ou te fez carinho em algum lugar que não deveria?
– Do que você está falando, Ian? – minha mãe indagou atônita.
Eu deveria imaginar que ela ouviria a conversa pela extensão da cozinha. O jeito que me comportei quando falei com ela a deixou preocupada com o que eu pudesse dizer ao meu irmão.
– Ele fez isso, Ian? – indaguei a ignorando.
– Não – meu irmão parecia achar aquilo completamente estranho, mas eu tinha meus motivos para perguntar.
– Pelo amor de Deus, Ian o que você quer dizer com isso? – ela indagou completamente desesperada.
– Eu não vou para casa esse fim de semana mãe – disse chorando – vou ficar aqui na escola.
– Não senhor! – ela praticamente gritou – Desliga o telefone, Pedro – ouvimos o bipe do telefone sem fio sendo desligado – Eu vou ai agora te buscar e você vai me contar o que está acontecendo!
– Não está acontecendo nada mãe – disse choroso – Foi só um pesadelo.
– Não foi só isso! – ela falou – Você está falando do mesmo jeito estranho que falava antes... – ela parou de falar, pois não conseguia dizer em voz alta que eu tinha tentado o suicídio.
– Eu não vou tentar me matar mãe – falei procurando uma desculpa para justificar minha ausência – vai ter uma festa junina aqui na escola e eu vou participar. Não é nada demais.
– Não minha para mim, Ian – ela ainda não tinha se convencido.
– Eu não estou – menti – Foi só um pesadelo horrível que eu tive, mas já passou. Vai ficar tudo bem. Te amo mãe. Tchau.
– Também te amo, Ian – ela ainda estava muito preocupada – Tchau.
E desliguei o telefone.
Bernardo
– Estou tão feliz que você voltou para o nosso quarto – Théo disse-me naquela manhã de sábado quando eu terminava de trazer minhas coisas.
– Você me encheu o saco a semana inteira – falei colocando minhas roupas de volta nas gavetas deixando a última que eu lhe tinha cedido. A semana foi lenta desde a noite de terça quando Ian me contou seu segredo. Eu ia a algumas reuniões dos góticos, mas sem estar caracterizado. Não me sentia à vontade com aquelas roupas pretas e maquiagem pesada, mas de certa forma eu gostava das poesias e dos textos que eles liam. Não sabia que curtia algo tão sombrio assim e me surpreendi com a forma como tais poesias tocavam em meu coração. Ian só apareceu na reunião de sexta-feira e ninguém quis saber o porquê. Nas palavras de Eliza: “Estamos curtindo esses dias de paz sem hostilidade”. Não pude deixar de me sentir ofendido com aquilo, mas antes que eu pudesse falar algo, Roberta interveio
...
– Sei que Ian é um babaca na maior parte do tempo, mas ele tem algum problema grande o assombrando – ela disse defendendo o amigo.
– Tem nada! – Everton falou – Ele é só um garoto mimado que acha que é gótico! Já viram os poemas dele? São uma merda!
– Acho que agora você é o babaca da turma – Lorenzo falou – Eu gosto dos poemas dele.
– Você curte os treinos de natação! – Everton debochou – Não tem moral para julgar nada.
– Vamos parar de com isso! – levantei o tom de voz – Nenhum de vocês sabe pelo que e ele passa, então vamos cuidar de nossas vidas!
E com isso o assunto foi encerrado.
...
– Vai pintar as unhas de que cor? – Théo indagou indo até o computador e colocando uma de suas playlists para tocar. Ariana Grande começou a cantar One last time.
– Acho que vou pinta-las de vermelho – disse olhando-as em seu tom azul – Para combinar com minha camisa xadrez.
– Vai ficar lindo! – ele disse se olhando no espelho – Eu estou pensando em tirar essas mexas azuis do cabelo – falou passando a mão pelo cabelo loiro – Já cansei delas.
– Vai deixar tudo loiro? – indaguei.
– Acho que sim – disse penteando os cabelos para o lado com a ponta dos dedos – Também acho que vou corta-lo.
– Se quiser eu te ajudo – falei pegando uma tesoura na mesa de cabeceira.
– Você está maluco, viado? – ele sorriu – Você vai me deixar careca! Eu vou marcar hora no salão que minha mãe vai e lá vou dar um up no visual.
E nós nos arrumamos juntos dançando e cantando ao som das músicas pop de Théo. Confesso que me empolguei bastante quando Bad Blood da Taylor Swift começou a tocar e Théo começou a rir da minha falta de talento musical. Chegou o final da tarde e nossos pares bateram na porta para nos buscar. Marcelo vestia uma camisa xadrez azul com um lenço vermelho amarrado ao pescoço. Sua calça jeans estava cheia de remendos de diversas cores. Ele até havia deixado um bigodinho crescer. Giovana estava deslumbrante com seu vestido rosa com meia calça branca e sapatilhas da mesma cor do vestido. Seus cabelos castanhos estavam presos em duas Maria Chiquinhas dos dois lados da cabeça. Suas bochechas estavam coradas devido a maquiagem e haviam sardas pintadas com lápis de olhos.
Elogiamos nossos parceiros e demos os braços. Nós quatro descemos até o ginásio onde tinha acontecido a festa de boas-vindas. Ele estava decorado por milhares de bandeirinhas multicoloridas e balões pendurados no teto como se estivessem voando. Havia uma fogueira falsa no centro do ginásio exalando ar e luzes para parecer que estava realmente em chamas. Uma banda contratada pela escola tocava músicas tradicionais de festas juninas, mas atrás dele havia equipamentos de mixagem indicando que mais tarde haveria um DJ.
Estavam todos ali, Fabio vestido de Caubói e Alice como noiva caipira, Dylan caracterizado com uma camisa verde acompanhado de uma menina da nossa turma que eu não sabia o nome, pois ela não falava com ninguém. Patrick deu uma passadinha no nosso grupo acompanhado de alguns colegas nerd todos sozinhos. Leonardo chegou acompanhado de uma menina ruiva trajando um vestido caipira azul bebê. Só quem não se uniu a nós foi Daniel. Na verdade eu nem o vi em lugar nenhum.
– Fica na moita galera, mas eu consegui contrabandear vodca e baseado – Leonardo falou animado – Está no vestiário lá na piscina.
– Eu ainda vou descobrir como você consegue essas coisas – Marcelo falou debochado – Sério mesmo garoto, você e um traficante!
– O melhor da escola – ele se vangloriou.
– O único da escola – Théo debochou.
Todos caímos na gargalhada e apesar dos protestos de Giovana, nós fomos para a o vestiário da piscina. Já haviam alguns alunos lá, mas eram bem menos do que da primeira festa. Cara de Chokito estava lá como segurança novamente e desta vez não nos barrou por estarmos acompanhado de Léo. Havia um isopor no banheiro masculino cheio de gelo e vodca. Leonardo nos serviu e começamos a beber. Havia uma névoa causada pela fumaça dos baseados que os alunos fumavam.
– Vê se não vai gritar no banheiro que tem maconha – Leonardo falou para Marcelo ao acender seu baseado.
– Eu nunca faria isso – ele riu se lembrando da primeira festa.
Todos riamos e nos divertíamos, mas a ausência de Daniel me intrigava. Não me lembro de tê-lo visto ir embora e quando perguntei a Théo onde ele estaria, ele apenas deu de ombros sem saber responder. Fiquei mais um tempo dentro daquele lugar mal iluminado e com uma névoa cada vez mais densa de fumaça até que fui para o lado de fora. Lá estava Marcelo e Théo se beijando na beira da piscina.
– Sente falta dele? – Giovana indagou se sentando ao meu lado.
– Sinto – admiti sabendo que seria inútil mentir para ela – Ele foi meu primeiro amor de verdade.
– Isso é especial – ela disse segurando minha mão. Olhei em seus olhos e ao contrário do que vi na primeira conversa que tivemos, Giovana não havia fumado maconha e nem bebido – Vocês nunca deveriam ter terminado.
– Eu nunca devia tê-lo traído – falei segurando a vontade de chorar – Ele estava certo em me largar. Eu o decepcionei.
Seu celular tocou e ela viu que era uma mensagem. Ela respondeu rapidamente tomando cuidado para eu não ver.
– Vamos voltar para festa – ela disse se levantando – Você precisa se animar um pouco.
– Não estou afim, Gi – resmunguei – Acho que vou voltar para meu quarto.
– Nem pensar, Bernardo de Andrade! – ela bronqueou – Você vai voltar comigo para a festa e vai se divertir!
Olhei para seu rosto por alguns instantes e percebi que não havia como discutir com ela. Me levantei a contragosto um pouco tonto devido a bebida. Ela segurou a minha mão e me levou de volta ao ginásio. Chegamos lá e começamos a dançar ao som do forró. Quando a música acabou o vocalista da banda fez uma declaração:
– Bom, galera vamos fazer algo um pouco diferente aqui agora – dizia ao microfone – Um aluno gostaria de cantar uma música para seu amado. Com vocês Daniel Vilella!
Não sei bem o que senti ao ver Daniel subindo no palco trajando uma roupa de caubói. Ele sorria e tremia devido ao nervosismo. Meu coração pulsava descontrolado enquanto eu mesmo tremia dos pés à cabeça.
– Bernardo – Daniel disse olhando diretamente para onde Giovana havia me arrastado no meio do salão – Lembra do dia em que fugimos de nossas casas e fomos para a minha casa de praia? Lembra do que falamos sobre nossas músicas preferidas? – eu lembrava perfeitamente de nós dois no carro sozinhos naquela noite logo após seu pai ter ameaçado tira-lhe a vida – Você me disse que sua música preferida era Asleep e você me explicou o porquê então eu lhe disse que minha música preferida era What do You Got e lhe expliquei o motivo – a banda ao fundo começou a tocar a introdução de sua música preferida do Bom Jovi – Hoje eu gostaria de lhe dedicar essa música que significa muito para mim.
Então ele começou a cantar aquela música que soava incrível na voz de Jon Bon Jovi, mas que em sua voz soava perfeita. Daniel cantava a canção com perfeição me surpreendendo, pois não sabia que ele sabia cantar. Lágrimas escorriam por meus olhos e me virei para Giovana que também chorava. Ela claramente era cumplice naquilo e a mensagem em seu telefone era para me levar para o ginásio. Meus outros amigos, com exceção de Dylan, vinham presenciar aquilo indicando que todos sabiam.
Théo chorava me olhando com felicidade. Com os lábios ele formou as palavras: Vocês merecem ser felizes juntos.
Voltei a olhar para Daniel que lutava para não chorar e fui me aproximando dele aos poucos. Os alunos abriam caminho para mim enquanto eu caminhava vagarosamente em sua direção. Não sentia meus pés e por esse motivo eu tinha a sensação de que iria cair a qualquer momento, mas não me importava. Tudo o que eu queria era ir até ele e lhe beijar.
Cheguei ao palco no momento em que ele cantou o último verso da música. Subi com a ajuda de dois garotos que estavam ali e lhe abracei apertado. Nossos lábios se encontraram pela primeira vez em muito tempo. Suas mãos apertavam minha cintura enquanto eu enterrava meus dedos em seus cabelos loiros e macios. Derrubei seu chapéu de caubói e ele derrubou o meu chapéu de palha na multidão que aplaudia e gritava eufórica. Nossos corpos se incendiavam de paixão.
Nós nos separamos e Daniel se ajoelhou diante de mim. Do bolso da calça ele tirou uma caixa azul aveludada. O vocalista da banda colocou o microfone perto de sua boca para que todos pudessem ouvir seu pedido.
– Bernardo de Andrade, você aceita ser meu namorado? – então abriu a caixa e ali estavam duas alianças de ouro.
“Aceita! Aceita! Aceita!”. Ecoava a plateia. Eu cobri minha boca com a mão sem conseguir formular nenhuma palavra. Sacudi a cabeça positivamente e Daniel sorriu. Pegou minha mão direita e colocou o anel em meu dedo anelar. Peguei o outro na caixa dando uma olhada na gravação da parte interior: “Forever and Always” Peguei sua mão direita e coloquei a joia em seu dedo anelar.
– Eu te amo – sussurrei entre as lágrimas – Te amo muito!
– Eu também te amo – ele respondeu me beijando.
Nós descemos do palco de mãos dadas e todos vibravam felizes por nós dois, mas ninguém no mundo poderia estar mais feliz do que eu naquele momento. Ninguém mesmo. Daniel tinha me perdoado e cantado aquela canção para mim. Isso espantou qualquer tristeza que eu poderia ter.
Ele nos levou até nossos amigos que nos deram abraços e nos parabenizaram pela volta do namoro. Mas o abraço mais especial para mim veio de Théo.
– Obrigado – disse a ele chorando – Você é um grande amigo.
– Agora eu sou um grande amigo – ele falou chorando também – Eu espero que vocês dois sejam muito felizes.
– E desejo o mesmo para você e Marcelo – falei.
Dei um beijo na bochecha de Théo e o mantive nos meus braços. Ele realmente havia mudado e se arrependido de tudo. Ele provou isso essa noite me ajudando a voltar com seu irmão. Foi Giovana que me trouxe aqui, mas aquilo com toda a certeza foi ideia dele. Eu amava meu melhor amigo mais que tudo.
Voltamos para o vestiário da piscina onde eu curtia Daniel e ele me curtia com intensidade para recuperar o tempo perdido. Dançamos agarradinho, nos beijamos com intensidade e nos acariciamos como nunca. Eu o amava e ele também me amava e era apenas isso que importava.
– O que lhe fez mudar de ideia quanto a mim? – indaguei quando estávamos sentados à beira da piscina com nossos pés dentro d’água e nossas calças dobradas até as coxas.
– Meu amor por você – ele disse acariciando meu rosto – Eu nunca te esqueci nem por um momento. Te ver no corredor era uma tortura.
– Também era uma tortura para mim – falei dando-lhe um selinho – Cada dia sem você era um pesadelo, mas eu não poderia te culpar nunca. Eu te magoei muito, Daniel.
– Shiii – ele calou minha boca com um beijo – Nunca mais pense nisso, Bernardo. Nunca mais pense que me magoou.
Sorri e nos beijamos novamente. Suas mãos deslizaram pelas minhas costas e entraram em minha calça apertando minha bunda. Meus dedos se emaranharam por seus cabelos enquanto ele descia seus lábios até o meu pescoço. Uma mistura de desejo e amor percorria meu corpo.
– Vou pegar um pouco de vodca, depois vamos para o quarto – ele disse – vai indo na frente.
– Ok – disse lhe dando mais um selinho – Te espero no meu quarto.
Ele se levantou, pegou o tênis na grama e correu para o vestiário. Eu sorri ao ver meu namorado desaparecendo naquela escuridão enevoada e fiz o que ele mandou. Peguei meu tênis e fui em direção ao vestiário passando pela cabana do zelador onde tivemos nossa primeira vez e onde participei de inúmeras reuniões dos góticos.
– Bernardo! – ouvi sua voz trôpega me chamar.
Dylan saiu da cabana do zelador praticamente tropeçando nos próprios pés segurando um copo de plástico. Uma garrafa vazia de vodca estaca caída no canto.
– Vai embora, Dylan. Não quero confusão! – falei passando por ele.
Mais apesar da embriagues, ele conseguiu correr e me segurar pelo braço com uma força descomunal.
– Eu estou cheio de tesão em você – ele falou com aquele hálito de álcool – Estou afim de relembrar nossa pequena festa no carro do meu pai.
– Me larga Dylan! – disse tentando me libertar, mas eu era mais fraco que ele.
Dylan me jogou no chão e se jogou em cima de mim. Seus lábios beijando meu pescoço e minha boca que resistia a ele vorazmente.
– Para de graça, Bernardo – ele falou completamente enrolado – Você não resistiu da última vez.
– Me larga! – gritei.
Dylan começou a tirar a calça quando ele chegou e o levantou pela camisa. Daniel socou a o rosto de Dylan com tanta força que eu podia jurar que o seu axilar foi quebrado.
– Se encostar nele novamente, eu te mato! – Daniel gritou.
Meu namorado me ajudou a levantar e juntos fomos para meu dormitório. Dei uma olhada para trás e pude ver Ian sair da cabana do zelador e parar diante de Dylan.
...
Obrigado a todos que comentam em meu conto e saibam que vocês são muito especiais para mim.
Yukeee, sinto-me lisonjeado pelo fato de você ter criado uma conta apenas para comentar em meu conto. E sim, muitos pararam de ler meu conto devido aos acontecimentos. Acho que eles esperam que eu escreva uma história de amor completamente clichê entre dois adolescentes, mas o que eu estou escrevendo é uma história de amor onde os personagens são falhos e fazem besteiras o tempo inteiro como uma pessoa normal faria. Mas infelizmente muita gente não consegue aceitar que os personagens são humanos e tem inúmeros defeitos e por isso idealizam um casal principal perfeito cujo amor nunca se abalará por nada. Mas não estou aqui para contar uma versão gay, moderna e mal escrita de Romeu e Julieta. E eu realmente fiquei desanimado no capitulo em que Bernardo traiu o Daniel, pois teve comentários dizendo que o conto estava decadente e que parariam de ler por que estava horrível. Recebi até mesmo nota zero pelo mesmo. Confesso que quis apagar o capitulo e escrever um novo, mas no fim me mantive fiel a história e segui com ela e com quem ainda assim iria acompanha-la. Que bom que ache-o imprevisível, pois me empenho bastante para isso. E sei que demoro muito a postar, mas eu realmente não estou tendo tempo para escrever. Eu tenho que ficar sem dormir para conseguir escrever e não estou falando isso no sentido figurado. Por isso a demora. Entendo o que quer dizer com “as pessoas acabam esquecendo do conto caso algo aconteça, ja que também seu conto possui um intervalo grande de postagem entre os capítulos (leve em conta que ja acompanhei contos diários) e isso acaba levando alguns leitores ao esquecimento, então se fosse possível postar em um intervalo menor setia perfeito”. Imagino que muitos deixem de ler por esse motivo também.
Me desculpa não ter lhe respondido na capitulo anterior, mas eu realmente só vi seu comentário ontem.
VALTERSÓ, entendo que considere que o foco da história está se perdendo, mas eu vejo o arco de Ian de outra forma. Acho que é apenas uma nova vertente da história. Quando idealizei “O internato”, eu o imaginei como lugar central onde a história de várias pessoas se cruzam e eu posso conta-las sempre. Na minha opinião o personagem principal é o próprio internato e não os personagens que uso para contar a história. Isso me permite criar diversas histórias no mesmo lugar não me prender apenas a um personagem. A história de Ian se cruza com a de Daniel, Bernardo da mesma forma que a de Théo se cruza também.
Gui Guri, muito obrigado pelos elogios. Creio que a maioria fica com essa impressão de que será mais um conto de amor adolescente pela grande quantidade de contos assim que existem no site. E quanto as personagens, eu não consigo contar uma história me prendendo apenas a um ponto de vista. Acho que deixa a maioria das histórias maçantes de se ler. Obrigado pela nota, fico realmente muito feliz. E basta deixar seu contato nos comentários e podemos sim trocar algumas ideias.
Dinho_S2, Ri muito com seu comentário. Eu nem pensei no Bolsonaro quando batizei o Jair, mas isso realmente prova que todo Jair não presta.
®Red®, Fico feliz que esteja gostando. Não sei nem o que te falar, pois qualquer coisa dita pode ser configurada como spoiler. Então só lhe digo para acompanhar os próximos capítulos.
Aos demais eu agradeço por me acompanharem até aqui e aguardem o próximo capitulo. Espero que tenham gostado deste assim como tem gostado do conto no geral. Até!