Foi um bom recesso, cheio de experiências maravilhosas e risadas. Um momento daqueles que a gente não quer esquecer nunca e sempre que estamos juntos, lembramos de algo engraçado e rimos como se tivesse acabado de acontecer.
Mas tudo que é bom (e ruim também) chega ao fim.
O restante da viagem foi divertido e tivemos um retorno tranquilo, no tempo normal. Loren e Victor quase nem pisaram em Salvador, foram lá nos meus pais contar a novidade e depois seguiram para o Haras. Júlia e eu ficamos com as malas deles, porque seria um peso desnecessário, e partimos para pegar o Brad e depois para nossa casinha. Estávamos há dois dias do retorno das aulas e há três de uma viagem a trabalho que eu precisava fazer. Eu já estava há algum tempo evitando viagens longas, porém já havia reduzido ao máximo e, mesmo assim, passaria alguns dias no Rio de Janeiro.
Odeio ficar longe deles e sem saber quando voltar é ainda pior. Com certeza eu tentaria fazer tudo em tempo recorde, mas sabia que não seria tão rápido.
Consegui levar e assistir à aula inaugural de Kaká no jiu-jitsu. Para a surpresa de alguns — não a nossa — ele já sabia muitos golpes e ficou radiante por finalmente poder iniciar os esportes que gosta e acompanhar Milena. Ele tem algumas restrições e, apesar do desejo de competir, o treinador pediu que ele focasse nos treinos e, com o tempo, veriam isso.
Ele ficava o tempo todo buscando aprovação de Mih. — Gostou? — Fiz certo? — Tá bom assim? — Foram frases que ouvimos repetidamente, e ele tinha um sorrisão no rosto.
— Parece que ele tem mais confiança em Mih do que no moço, né, amor?! — Disse Juh.
— É porque ela o treina há mais tempo — Brinquei.
Nós passamos na sorveteria preferida deles para comemorar e voltamos para casa.
— Eu não vou conseguir dormir hoje, foi muito legaaaaaal!!! — Vibrou, ficando de pé no sofá.
— Acho bom o senhor conseguir, porque amanhã tem aula pra ti... — Avisei-o.
— Eu vou contar pra todo mundo que eu faço jiu agora! — Kaká exclamou animado.
— Agora eu quero saber como você já sabia fazer tantas coisas, hein? — Perguntou Juh, carregando-o.
Energicamente, Kaká se prendeu ao corpo dela, mas, ao perceber a pergunta, se escondeu dentro do pescoço dela, rindo descaradamente.
— Acho que a gente precisa interrogar é essa mocinha aqui! — Falei, puxando Mih e fazendo cócegas.
Nós ficamos brincando assim, tentando perguntar insinuando o que já sabíamos, e eles escorregavam nas respostas. Chegaram até a dizer que Kaique aprendeu vendo vídeo no YouTube.
— Vocês estão sabidinhos demais, mas ainda precisam de banho... Vão tomar! — Falou Juh, e eles foram, bem elétricos.
— É... Acho que amanhã teremos trabalho para acordar esses dois — Disse, puxando a minha gatinha pela cintura, sentando-a no meu colo.
— É... — Juh concordou, pensativa. — Vou sentir tanta saudade sem você aqui... — Falou, mexendo nos botões da minha camisa, sem me encarar.
— Também vou sentir saudade, meu amor... Mas aí eu volto e a gente mata, tá bom? — Ela concordou, balançando a cabeça positivamente. — Eu vou tentar ser o mais breve possível, é algo importante para mim, você entende, não é? — Perguntei.
— Entendo, entendo... Mas não queria que você fosse... — Ela desabafou, bem tristonha.
— De certa forma, eu também não queria... — Falei e levantei o seu rosto pelo queixo. — Te amo, gatinha!
— Eu também te amo, amor — disse-me, e me beijou.
Nós também fomos tomar banho, e a bichinha estava toda cabisbaixa. A abracei e ficamos um bom tempo assim, só olhando uma para a outra enquanto fazíamos carinho.
Preparei o jantar das ferinhas, que continuavam com a bateria pra lá de cheia, e depois disso, foram para a cama.
Fiquei conversando bastante com meu amô, enchi de dengo, de carinho, e ela, toda manhosinha, é meu ponto fraco. Até a voz muda, a carinha de coitada... Tudo mexe comigo.
— Sabe o que eu estava pensando? Sempre que eu estiver na clínica, dá para a gente fazer o mesmo daquele dia e almoçarmos juntinhas. O que você acha? — Perguntei, enquanto fazia cafuné.
— Eu quero muito... — Ela me respondeu, mas ainda triste.
— Vem cá, vem, gatinha... — Chamei, e Juh deitou por cima de mim.
Deu alguns beijinhos enquanto passava as mãos de leve em suas costas.
— Não gosto do seu trabalho. — Ela falou com certo rancor, o que me fez rir.
— Nooossa, que feio... — Brinquei. — Não gosta de ver sua mulher ajudando pessoas?
— Não é isso! — Ela levantou o rosto me encarando, tentando se explicar.
— Que egoísta da sua parte... — Falei, rindo.
— Não, eu só não gosto quando você precisa ficar tanto tempo longe, principalmente depois da gente ficar tanto tempo juntinhas. — Juh se justificou.
— Amor, isso é saudade, né? Não tá beirando dependência emocional não, é? — Perguntei, levemente preocupada.
— Huuuuuuuuum, acho que é só saudade, mas vou conversar com a psi. — Ela me respondeu pensativa.
— Faz isso, e... Também quero que você marque uma consulta com sua ginecologista, seu ciclo não tá normal, reparou? — Questionei, tentando ser o mais natural possível, tudo que se refere ao útero mexe muito com ela.
— É verdade, amor... — Juh disse e puxou o celular para olhar o aplicativo que ela usa para monitorar o ciclo.
Estava lá, vários pontinhos rosas marcados. Em um mês, ela menstruou duas vezes em um curto intervalo de tempo.
— Não deve ser nada demais, às vezes acontece. Sua médica vai explicar direitinho e tudo vai ficar bem. — A tranquilizei antes que dissesse qualquer coisa.
— Você acha que eu tenho algum problema e que por isso nossas tentativas... Você sabe... — Juh tentava continuar, mas as palavras pareciam não vir.
— Acredito que só não foi a hora certa, môh. Se tivesse algum problema, nós já saberíamos pelos exames. — A confortei.
Em meio aos carinhos, pegamos no sono. No outro dia, foi o maior sacrifício para sair de casa. Os guris não queriam levantar e ainda dormiram a caminho do colégio. Chegaram lá com um péssimo humor e com a carinha amassada. Quando eles estavam entrando, eu gritei: — Eu avisei... — e os dois me olharam com uma carinha triste.
No dia da minha ida ao RJ, fiz questão de seguir a nossa rotina matinal normalmente, porque queria passar todo o tempo possível com eles. Kaique e Milena entraram, e eu ainda fiquei grudada em um abraço com Juh, demos alguns beijinhos, e ela ficou no meu ouvido dizendo para eu tomar cuidado, para avisar quando chegasse e que eu não demorasse. Confirmei apertando bem forte e sentindo o cheirinho gostoso dela. Segurei no queixinho e dei um último beijo na minha gatinha emotiva.
— Não chora, senão eu choro também. — Falei, e ela deu um sorrisinho forçado.
— O seu cheiro ficou todinho em mim — Juh disse, mudando de assunto e cheirando a camisa do uniforme.
— É pra você não esquecer de mim — Brinquei.
— Como se fosse possível... — Ela devolveu.
— Huuuum, tenho que ir, e você também, meu amô... — Falei, olhando para o horário.
— Se eu te beijar de novo, acho que fujo com você — Juh brincou, e demos um selinho apenas.
Viajar a trabalho para mim é um misto de realização e solidão. Foi algo que eu demorei para começar e sempre quis muito. Apesar de ser cansativo, as obrigações são muitas, e é algo que me traz satisfação.
Quando finalmente chegou a noite no meu primeiro dia no hotel, me vi em um vazio. Não tinha aquele som familiar, a falação dos meus filhos no meu ouvido, as histórias e curiosidades que surgem sem aviso. Os pequenos gestos de carinho da minha muié, o simples fato de estarmos juntas preparando o jantar, dão uma sensação de plenitude que falta quando estou longe. A saudade, então, bate forte, lembrando que, por mais que o trabalho seja importante, o que realmente faz o meu coração bater mais forte é a presença daqueles que amamos, da minha família. E, de repente, a noite se tornou um lembrete do quanto é bom estar com eles. O tanto que eu sinto falta dos meus.
Eu estava prestes a ligar para Juh, quando meu celular vibrou com a foto dela na tela.
— Eu ia ligar para vocês agorinha. — Falei para meus três amores.
— A gente já tá com saudade, mãe! — Mih falou, triste.
— Também estou, amor... Só mais uns dias e eu volto, ok? — Tentei tranquilizá-la, e ela assentiu.
— Mãe, o Brad subia na sua cama e não queria sair de jeito nenhum. — Falou Kaká, morrendo de rir.
— Quando eu digo que esse cachorro quer tomar o meu lugar... — Brinquei, e eles riram.
A gente conversou sobre o dia deles. Júlia contou que Kaique já havia anunciado aos quatro cantos da escola que agora é jiujiteiro. Falei um pouco sobre os lugares que rodei, com quem estive, e a reação das crianças foi bem engraçada, tipo: "Coitada, que dia chato", mesmo eles não entendendo. Eu ri um pouco disso.
Eu já ia me despedindo, mas Juh disse que ainda queria falar comigo. Me despedi dos nossos filhos porque iam dormir e fiquei curiosa sobre o que minha gatinha queria me dizer.
— Tá me levando para o quarto? Vai fazer um streep tease pra me animar, é? — Zoei. De todas as possibilidades, essa era... Mínima.
— Que isso, amoooor! E fale suas coisas baixo, daqui a pouco eles ouvem e tão me perguntando o que é isso. — Ela me repreendeu.
— Desculpa, desculpa — Pedi, mas ria dela.
Juh apoiou o celular aparentemente no travesseiro e se jogou na cama.
— Amor, amanhã eu vou almoçar com a Sabrine... — Ela me disse, visivelmente hesitante.
Não entendi o porquê. Não tenho nada contra ela sair com as amigas. Até gosto que ela cultive outras relações além das familiares.
— Que bom, amor... Mas não estou entendendo, por que está me falando assim? — Perguntei.
— É que ela quer conversar sobre uma coisa, já me adiantou o assunto... É que... — Júlia continuava vacilante nas palavras.
Pelo olhar envergonhado, eu já sabia mais o caminho que ela queria seguir.
— É sexual? — Perguntei, rindo.
— Sim... Mais ou menos... Acho que não vamos a fundo, porém não quero passar vergonha, não sei quase nada. — Ela me respondeu.
— Aí você está recorrendo a mim, que sou uma enciclopédia do sexo! — Brinquei.
— Isso! — Ela respondeu animada, levando o que eu disse a sério.
Comecei a rir e ela também, quando percebeu.
— O que Sabrine já te disse? — Questionei, pensativa.
— Ela e o marido querem abrir o relacionamento. — Juh me informou.
— Que babaaaado! — Falei, incrédula, com uma das mãos na boca.
— É... — Ela completou, rindo.
Eu sei que não devo julgar as pessoas à primeira vista. Aquele velho ditado "não julgue o livro pela capa" sempre me fez refletir sobre como somos rápidos em formar opiniões, sem conhecer o verdadeiro conteúdo. Mas, por mais que eu entendesse isso racionalmente, confesso que nunca imaginei que algo assim fosse acontecer com Sabrine e Rafael. Não por ela, que é super aberta e, pelo que Juh me conta, é uma safada que nem eu, mas por seu marido, que é um homem bem sério e fechado, pelo menos era o que eu achava até o momento. Porém, a vida é assim mesmo, cheia de nuances surpreendentes e, no fundo, quase todos têm desejos ocultos. Melhor ser sincero e aberto com a parceira do que meter galha por aí.
— Mas como você quer que eu te ajude? — Perguntei.
— Espera um pouquinho que já volto. — Juh me disse e saiu correndo.
Voltou com um bloquinho de notas e uma caneta, novamente me fazendo rir.
— Você vai anotar tudo o que eu vou dizer? — Perguntei.
— É, amor, ué, vai que eu falo alguma coisa que ofenda... — Ela se justificou. — Pode começar! — Completou, animada.
— Mas o que você quer que eu diga? — Perguntei, e ela fez uma feição de que nem sabia o que perguntar. — O que você acha disso tudo? — Questionei.
— Eu não ia conseguir nunca abrir nosso casamento, mas eu entendo e respeito quem pensa assim. Se eles dois entraram em consenso, significa que é uma vontade dos dois, né? Então não tem problema, se é o combinado do casal e eles acham que assim o casamento vai fluir, estão certos em dar esse passo. — Juh explicou seu ponto de vista pausadamente.
— Você não precisa da minha ajuda para nada, gatinha. Tá pronta para conversar com sua amiga não monogâmica. — Brinquei.
— Então eu posso falar não monogâmica? Ou é pejorativo? — Ela me perguntou.
— Pode, sim. Liberal, flexível... Você que escolhe o melhor jeito. — Pontuei.
Enquanto eu ia falando, Juh ia escrevendo. A coisinha mais fofa do mundo fazendo anotações sobre os termos.
— Vai ser aberto para os dois? — Perguntei, e Júlia ficou pensativa.
— Ela não me disse, não tinha pensado nessa possibilidade... Quem será que propôs? — Fui questionada.
— Ih, amor... Não sei, provavelmente Sabrine... — Falei.
— Ela deve me contar no almoço. — Juh concluiu.
— Só não esqueça de me contar tim tim por tim tim. — Disse-lhe, e rimos.
Inevitavelmente, entramos no assunto saudade. Daria tudo para poder dar um beijo na boca daquela muié gostosa que estava na tela do meu celular e dormir a noite toda agarradinha com ela.
— Meu Deusssss, como eu vou dormir??? — Ela me perguntou, se espalhando na cama.
— Era para você ter chamado os guris. — Falei, rindo.
— Mas a gente precisava conversar. — Juh acentuou, e eu concordei.
— Vai ser difícil para mim também, eu gosto de dormir com meu amorzinho. — Desabafei, agarrando um travesseiro.
Resolvemos não sair da ligação e ficar conversando até pegar no sono, e foi o que aconteceu. Demorou mais do que a gente está acostumada, mas conseguimos.
No dia seguinte, após o horário de almoço, Juh me enviou uma figurinha.
~ Não sei vocês, mas nós temos figurinhas de fofoca. Quando é quente e precisa ser presencialmente, nós enviamos a do Plantão da Globo. Quando é virtual, a gente envia uma galinha oferecendo fofoca e a outra responde com um pintinho que tem uma xícara aceitando.
E ela começou a me contar que correu tudo bem, que era aberto apenas para Sabrine, que Rafael quem propôs para apimentar a relação e pelo fato dela ser bissexual.
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Várias interrogações passaram pela minha cabeça: O que ser bissexual tem a ver com abrir o relacionamento?
— Só não entendi a última parte, amor. — Falei.
— Ufa! Quando ela falou, eu sorri e balancei a cabeça, mas também não entendi, não. Achei que era uma coisa de hétero e que era melhor não perguntar para não passar vergonha. Sabrina disse que adorou a ideia, e eu falei que fiquei feliz por eles estarem bem. — Me falou, e eu ri imaginando a cena.
— O pessoal acha mesmo que ser bi é bagunça... Bom, mas pelo menos eles estão felizes... — Comentei.
— Ele deve confundir o B de LGBT com bigamia. — Juh finalizou, e nós rimos.
Os outros dias seguiram da mesma maneira, com exceção do último. Como eu já contei, trabalho com amigos e, quando nós discordamos ao ponto de discutir, machuca, porque são meus amigos. Por mais que eu saiba que iremos nos resolver, e que aquilo não é e nunca será mais forte que a nossa amizade, nunca é uma situação agradável, nem poderia ser.
A recepcionista da clínica me ligou, e logo após a minha secretária também. Elas me informaram que umas condições e o posicionamento tomado pelos médicos não me agradaram. Entrei em contato com eles, e o tom da conversa foi alterando, e percebi que por celular não daria para resolver nada. Marquei com eles no outro dia, que seria o meu dia de descanso.
Nesse lenga-lenga, quase perdi o voo de volta para Salvador, mas, por sorte, consegui embarcar. Coloquei meu fone na intenção de dormir, porém não consegui. Fiquei puta com os últimos acontecimentos, e minha cabeça se encheu de pensamentos.
Se não fosse um cenário profissional, eu xingaria com gosto. Contudo, foi mais prudente insultá-los apenas em pensamentos.
Cheguei na minha querida cidade de madrugada. Mais cedo, Juh se ofereceu para me buscar, mas achei melhor ir de Uber mesmo. Quando estava perto, mandei mensagem para que ela abrisse o portão, pois eu estava sem chaves e nada dessa mulher visualizar, liguei, e todas as ligações chamavam até cair. Eu, que já estava furiosa, quase explodi de tanta raiva.
Tentei de todas as formas focar na saudade que eu estava sentindo, que com certeza potencializou minhas emoções, mas meus últimos resquícios de paciência haviam sido consumidos.
No último segundo, quando desci do carro, meu celular vibrou. Era Júlia dizendo que tinha acabado de sair do banho, mas que já tinha deixado tudo aberto.
Assim que entrei em casa, dei de cara com ela vestida com o que me pareceu em um primeiro momento uma longa camisa social branca, mas na verdade era algo mais leve e despojado que marcava o o bico dos seios denunciando que nada mais estava por baixo. Antes que eu dissesse qualquer coisa, Juh abriu a camisa e deixou pendurada nos ombros, fiquei vidrada naquele corpo maravilhoso. Eu estava com tanta saudade e necessidade dela que tinha medo do que poderia acontecer ali mesmo naquela sala.
Fui me aproximando, conectadas por aquele sedutor olhar, até que nos beijamos. Não foi um beijo calmo ou lento. Foi voraz, com vontade, desejo acumulado e barulhento. Deixei a sacola que segurava pelas alças caírem lentamente e me rendi completamente a aquele delicioso beijo. Segurei firme na cintura de Júlia e caímos no sofá sem soltar uma da outra.
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