Coração Ferido - Capítulo XXXIV
Gostava de Turim, mas não sentia o clima tão italiano como deveria ser, talvez cidades como Roma, Florença ou Nápoles e Palermo, cidades maiores, mas não tão industriais quanto Turim, deveriam ser tão carcamanas quanto um italiano bêbado dançando tarantela em cima da mesa em uma cantina onde a mama cozinhava bêbada também.
Capital do Piemonte cuja geografia era impressionante com vista para os alpes e os famosos lagos de altitude, a região se mostrava um tanto francesa, um tanto suíça, mas sem perder o charme do idioma e a grosseria dócil de seus habitantes, sem contar que estávamos no coração automobilístico do país e muito próximo de cidades como Gênova, Parma, Bolonha Imola e Milão, essa última o coração econômico e de moda do país de todo o país e um dos mais importes do continente, era certo, eu estava em uma das regiões mais ricas da Europa.
A nossa casa ficava em um bairro residencial e muito antigo da cidade, na sua maioria eram pessoas velhas, festeiras e carismáticas, mas um tanto quanto tradicionais e conservadoras, visto que muitos só falavam italiano e Veneto e as poucas que falavam inglês se recusavam a usar um idioma estrangeiro, sempre preferindo falar no seu idioma mesmo. A rua em que eu morava era praticamente toda habitada por funcionários da Fiat, Lancia e da Alfa Romeo, aliás, eram muitos os carros dessas marcas estacionados na rua o que fazia um saudosista encher seu coração de alegria, principalmente se ele era funcionário de uma dessas montadoras que impulsionavam o comércio na cidade.
Nas primeiras duas semanas aproveitei alguns dias com sol e resolvi explorar a região já que as obras na nossa frente de serviço estavam paradas por causa da neve e gelo que impediam a terraplenagem de avançar. Sai para visitar alguns pontos turísticos da cidade, como as antigas construções com influência barroca e romana. Vinícolas, bares e cafés, fui ao cinema, fui a Nice, na França, Genova, Parma e Imola e fui até a Zurich junto com Enola, ela queria comprar chocolates, então pegamos o trem, passamos pelo túnel de São Gotardo o que para mim foi esplêndido já que era uma das maiores obras ferroviárias do mundo moderno, eu obviamente fotografava e compartilhava com a minha família e amigos, muita coisa ainda era nova para mim.
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No fim do primeiro mês que estava em Turim havia uma festa tradicional na cidade, esse evento reunia muita gente da região e dos países próximos. A festa acontecia durante três dias e no sábado à noite todo mundo decidiu ir e eu fiquei em casa, depois de todo mundo protestar para que eu fosse também, mas eu estava cansado pois aquela semana tinha sido cansativa, estávamos executando as fundações de um dos viadutos da rodovia que passava por um trecho montanhoso e isso estava tirando nosso sono, pois um dos equipamentos teve que ser deslocado de Skopje onde o maior viaduto com quase 1 km estava sendo executado, era um pesadelo logístico, mas era o que eu gostava de fazer.
- Eu deixei uma sopa pronta para você Fabrício, na hora de dormir se cobre, li no noticiário que hoje fará
Acabei ficando sozinho pois todos decidiram sair e se divertir, mas o frio não me animou, fiquei no meu quarto lendo e usando meu notebook. Tão logo abri meu Skype Luciano me deu oi, parecia que ele me esperava, sorri e abri a cam.
- Como vai? Está tudo bem por aí? – Ele sorriu.
- Sim... Fabrício – ele parecia um pouco tenso.
- O que foi Luciano? – Perguntei, ele fez um pouco de cerimônia.
- Quando você vai voltar para casa?! – Luciano estava mais carente do que o normal, isso me matava por que eu estava trepando as paredes e ele vinha todo chorão no Skype, fora a saudade que eu sentia dele, era grande, era forte.
- Luciano, calma, assim você só me faz sentir mais culpa por eu ter saído do país – ele então baixou a cabeça, estava contrariado.
Eu odiava quando Luciano fazia draminha, era um homem alto e barbudo, mas virava o rei do drama e da carência.
- Eu vou ir aí te ver, eu tenho que ir visitar um fornecedor em Bruxelas mês que vem e vou dar uma esticada até a Itália, quem sabe não te convença ou não te drogue e te traga a força comigo... – ele riu, mas eu não, por um momento pensei se ele poderia fazer algo assim.
- Para Luciano, não fala bosta... – fechei a cara – você não conseguiria me despachar como bagagem sem levantar suspeita e a mama general aqui faria ensopado de carcamano brasileiro contigo... – Ele arregalou os olhos, eu ri.
- Eu estou brincando... – ele então se aproximou da cam.
- Bobo... – Ele coçou sua barba.
- Eu posso ser muito insistente quando eu quero, de bobo não tenho nada... – ele me fitou e mordeu os lábios.
- Eu sei... – Ri, pois Luciano ainda estava mordendo os lábios.
- De qualquer jeito eu vou passar aí te ver, vou programar minha volta via Milão ou Roma e fico uns dois dias contigo aí, você não sabe como eu estou doido para te pegar de jeito Fabrício, eu chego a sonhar que estou transando contigo e acordo todo melado, quero te rasgar no dente seu safado... – ruborizei com sua ousadia, ele me encarou.
- Luciano...você está perdendo a compostura, você tem que transar urgentemente.
- Esse é o problema, com quem eu quero transar está longe de mim, tem um oceano me separando dele... – Caralho, pensei comigo mesmo que se eu estivesse com ele pessoalmente eu estava muito fodido.
- Goza pensando em mim... – Ele se aproximou da cam.
- Eu quero gozar nessa sua carinha, te deixar todo meladinho, quero te ver delirar com minha porra em sua cara... – minha cara queimou, meu pênis começou a ganhar vida, eu queria fazer um joguinho, estava sozinho, com o cu piscando e com o tesão lá no céu.
- Para de me falar isso, eu sou um moço de família... – Ele riu debochadamente.
- Não é não! – Exclamou - é um moço muito puto e safado que transa bêbado com o amigo no tapete da família... – fechei a cara.
- Para... – Me fiz de tímido – foi a bebida... – Era mais fácil para se livrar da culpa.
- Para de se fazer de santinho, se solta para mim vai, eu sei que você gosta, nem parece aquele puto safado que quicou e rebolou com maestria na minha pica e gemeu me chamando de teu macho – caralho, minha cara estava no chão, ou melhor, no cu - sabia que pedi aquele tapete para o seu pai, ele não jogou fora, me deu de presente, de recordação, vou guardar com carinho por que quero te virar do avesso em cima dele, eu vou fazer você gozar pelo cu Fabrício...eu estou me segurando para não ir te buscar na marra... – eu não sei se ficava de pau duro ou envergonhado com o que ele disse, só vi quando Luciano tirou a camisa e o pênis para fora e começou a alisar o peitoral.
- Luciano... – então o fogo subiu, tirei minha roupa, meu quarto era alto, minha sacada estava com a porta fechada assim como a do quarto que estava trancada a chave. Luciano deitou na cama se apoiando na cabeceira, seu pênis em riste, seu peito e pernas peludas, o safado estava sem roupa nenhuma e me olhava com cara de safado enquanto massageava o pau – quer dizer que o senhor estava pelado da cintura para baixo? Está entrando em chats de sexo Luciano? Está batendo punheta com estranhos no Skype? Seu safado... – Fitei ele que me olhou com presunção.
- Talvez – ele me fitou – conheci uma loura muito gostosa - ele mordeu os lábios, eu fiquei meio puto com essa.
- Que bom saber, vou lembrar disso da próxima vez que o vizinho turco super gostoso me chamar para tomar chá com ele e eu me sentir culpado, quem sabe não tome chá com leite... – Fui interrompido.
- Não se atreva, eu te busco aí na marra e te trago para casa e de quebra ainda me entendo com esse turco de lojinha... – disse ele de cara fechada.
- Na marra é? – mordi os lábios - quer dizer que se eu for um menino mau você vai me castigar é, vai me dar surra de cinto? – Seus olhos me fitavam, acompanhavam o movimento das minhas mãos pelo meu corpo, eu estava pegando fogo - vai me ensinar boas maneiras Luciano? – Ele me olhou com cara de safado.
- Todas as vezes que falo contigo estou pelado, sua voz me faz ficar duro meu puto gostoso, não resisto e gozo... – Luciano mordeu os lábios, eu o fitei – quero te castigar muito seu menino mau, boas maneiras vai ser o de menos, teu ursão quer te deixar molinho...molinho... – Luciano ficou envergonhado, eu fiquei mais ainda.
- Uau! – Exclamei - que boquinha suja que você tem ursão - estava incitando ele a brincar na cam.
- Essa boquinha pode ser bem mais que suja... – Ele arqueou a sobrancelha.
- Luciano...está tentando me seduzir pela web cam? – Perguntei, ele riu.
- Estou conseguindo? – Perguntou se alisando todo.
- Sim, está... – lambi os lábios.
- Fabrício... – Luciano começou a se tocar.
- Isso Luciano... – mordi os lábios – esfola esse pauzão, ou melhor, goza na minha boquinha vai...bate ele na minha cara – Luciano gemia, eu podia ouvir seus gemidos ofegantes, a intensidade dele se punhetar me deixava tesudo, eu gostava de ver ele emxer no pau.
- Então vamos gozar juntos.... - e mesmo sem acreditar 30 minutos depois eu ele gargalhamos, eu fiz sexo virtual com o meu talvez namorado, mas com certeza o melhor fodedor que tive.
- Dorme bem meu amor... – ele então alisando o corpo e me mandando um beijinho sorriu.
- Você também meu amor... – fiquei vermelho quando ele me chamou assim, era estranho, mas era gostoso.
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Odiava a rotina, a monotonia. Já não era tudo tão novo e nem tão impressionante, também já faziam 2 meses que eu estava ali. Alguns costumes, alguns trejeitos e talvez um dos mais importante deles, a comida me faziam lembrar da minha família, ou melhor, da região onde nasci, pois ali eu não era forasteiro, mas não era nativo, eu era o meio termo e ter o passaporte vermelho só fundamentava melhor isso.
Em uma sexta-feira estávamos ao redor da mesa. A mama tinha feito algumas piadinas recheadas com pecorino, carne, rúcula e tomate seco e especiarias, um banquete já que ela estava comemorando seus 50 anos de idade. Eu, Josh e Pablo decidimos comprar um tiramisu e algumas garrafas de vinho, pois a mama gostava de beber um bom Chianti ou um saboroso Prosecco. Rick não quis nos ajudar, alegou que estava ocupado demais para tal atividade, ainda alegou que era veadagem demais, pior para ele que no fim acabou ajudando a contragosto.
- Feliz aniversário meu amor – Marcelo entregou um embrulho e beijou sua esposa com carinho me fazendo lembrar meus pais.
- Obrigado meu amor, obrigados rapazes... – sorrimos, era bom um momento em família.
- Rapazes, agradeço o esforço que vocês estão fazendo, a Enola e eu estamos muito felizes de ter vocês aqui... – Marcelo estava um pouco alegre e emotivo e Enola já tinha chorado quando cantamos parabéns para ela em italiano já que era o único idioma que ela falava.
- Imagina, foi um prazer preparar essa surpresa para mama... – sorri e levantei minha taça reverenciando ela.
- É mama, não foi trabalho nenhum para a gente... – Ironizou Rick sendo repreendido por Josh, Pablo o encarou com tristeza.
- Bom rapazes, que tal nós comermos essa Comida maravilhosa, hein? – Marcelo então se serviu de uma piadina e assim todos fizeram o mesmo.
No decorrer do jantar notei que Pablo estava cabisbaixo, distante, calado. Ninguém parecia perceber, ou fingiam já que uma das regras ali era não se intrometer na vida particular dos intercambistas, regra essa que mama e Marcelo viviam quebrando. Rick estava estranho também, mas ao contrário de Pablo permanecia com sua pose altiva, arrogante, as vezes o pegava olhando com raiva para Pablo que se encolhia assim que os olhos dominadores de Rick o encaravam. Josh também percebeu e me olhou sem entender o porquê, nós tínhamos uma convivência muito boa, por engenharia e arquitetura serem áreas próximas era normal ficarmos conversando e fora que os ajudava a melhorar a pronuncia. Rick era o que menos interagia com a gente, logo no início ele criou caso com Pablo pelo fato da sua orientação, mas quando contei a eles que era gay notei que tinha algo mais, pois o problema era Pablo, Rick não gostava dele, na verdade era um babaca cheio de músculos que só pensava em si mesmo.
Cheguei a pensar que o problema dele era a família. Eu sabia que ele estava com saudades de casa tanto quanto eu, eu meio que adotei os rapazes como irmão, mas Pablo era mais próximo, era sul americano então basicamente tínhamos uma cultura parecida já que éramos de países fronteiriços e os dois descendentes de italianos.
Naquela noite eu ia conversar com ele e após ajudar Marcelo e Enola com a louça do jantar e rever um cálculo de um exercício de Josh que ele havia me pedido, fui procurar Pablo o encontrando na sala de estar. Ele estava distraído, seu olhar vago, parecia angustiado e não percebeu eu me aproximar.
- Posso me sentar? – Perguntei. Ele sorriu.
- Fica à vontade - e assentiu me dando espaço para sentar ao seu lado - noite linda né Fabrício? – concordei com ele – Mendonza neva, mas nunca tem tanto glamour, é sempre aquela neve andina, aqui é neve com etiqueta – ele riu e balançou a cabeça com o próprio comentário.
- Bobo... – comentei sorrindo.
- Mas é – ele me olhou e quase pude ver o mesmo olhar de Guilherme – para mim é um sonho estudar aqui, meu pai não concordou muito, mas foi o primeiro e chorar quando me despedi deles em Buenos Aires... – acariciei seu ombro.
Pablo então fechou a cara de novo, ultimamente ele estava mais quieto e isso era estranho pois ele era o mais comunicativo.
- O que foi Pablo? – Perguntei ele alguns minutos depois, ele estava sentado olhando a noite lá fora – sua feição não está legal, você está triste... – ele me encarou, não precisou nem assentir para eu saber sua resposta. Pablo fazia o estilo descolado e fashion, era um pouco afeminado e espevitado, mas era fiel e um excelente amigo e muito carinhoso com todos, seu sorriso e carisma agradavam a todos, ou melhor, quase todos, a mama mesmo adorava paparica-lo, era ele quem ia junto com ela para fazer as compras ou então tirava eu e Josh para Cristo e nos fazia ir com ele a feira de roupas artesanais e a amostras de tecido, odiávamos fazer isso, mas era como se fossemos irmãos, um apoiava o outro.
- Não foi nada... – disse ele desviando seu olhar para a janela, lá fora se via as luzes da cidade e a sombra dos alpes lá longe.
- Tem certeza... – eu sabia que ele estava aflito com algo, ele baixou a cabeça e quando se levantou para falar ele olhou assustado em direção a sala.
- Vamos dar uma volta pelo bairro? – ele pegou em minha mão, levantou e me puxou junto dele.
Passamos pela sala, subi para o quarto e vesti um casaco e um cachecol preto para espantar o frio. Ao descer vejo eles parado, então Rick aparece na sala vindo da parte de trás da casa.
- Vamos? – Pablo ficou aliviado ao me ver.
- Aonde vão? – Perguntou Josh desviando a atenção do seu estudo. Rick estava próximo ao corredor e parou para ouvir a resposta.
- Vamos dar uma volta... – Disse Pablo olhando com frieza para Rick o que me fez entender que ali era mais do que ódio, era rancor, decepção.
- Você não quer ir conosco e pa... – Fui interrompido por ele.
- Não ando com veados – Respondeu Rick se aproximando. Ao ouvir isso Josh se levantou e peitou e tentou apartar.
- Calma aí Rick, se você não quer ir não precisa ser apelar, qual o seu problema cara, os esteroides estão te fazendo mal? – Josh com toda sua educação e calma canadense interviu, não que precisasse de alguém para me defender.
- Não te mete xarope de bordô... – Ele empurrou Josh.
Pablo então vendo a cena se pronunciou, vide a indignação do grupo perante Rick e seu comportamento.
- Realmente, você anda com babacas...covardes...– cuspiu Pablo se encolhendo quando Rick reagiu querendo ir para cima dele. Fui mais rápido e antes de ele se aproximar eu o peitei.
- Se eu fosse você não faria isso... – Ele me fitou.
- Saia da minha frente, meu assunto é com ele – Respondeu tremendo de raiva.
- Lidar com brutamontes do seu tamanho para mim é bem fácil...eu sou pós-graduado nisso – ele então estralou os dedos...
- Você não mete medo em ninguém... – interrompi ele.
- Quer pagar para ver? – Ele então me olhou estranho, na verdade seu olhar desviou do meu.
- Tanto faz... – Ele então recuou e subiu as escadas – vocês não passam de uns babacas fracassados, nem você salva Fabrício... - Pablo deu as costas e Josh me fitou tentando entender, eu dei de ombros e fui até a porta.
- Quando voltar eu corrijo o exercício para você, pode ser? – Ele me olhou.
- Pode sim... - assentiu e voltou a atenção ao caderno
- Não comente isso com o Marcelo e a Enola, vamos deixar em off... – Josh respirou fundo.
- Ok, mas se ele voltar a ter esse tipo de comportamento nós teremos que tomar providências... – Josh me encarou – um cara desses vem de família religiosa, para ele só o que vale é a bíblia, churrasco de porco e peito de boi e uma Winchester 73, esse pessoal do Texas é maluco, se acontecer de novo teremos que contar.... – Assenti e então fechei a porta sentindo o ar gélido bater em meu rosto.
- Espera Pablo – ele olhou para trás e parou.
Pablo andava em um silêncio enlouquecedor. Apesar do frio, as ruas estavam movimentadas e logo Marcelo e Enola nos alcançaram acompanhando eu e Pablo até a esquina onde eles sentaram em um banco para namorar e tomar um chocolate quente com avelãs, coisa bem normal em uma temperatura dessas.
Pablo olhou para eles e sorriu, mas logo fechou a cara como se algo o incomodava.
- Será que um dia eu vou ter isso Fabrício? – Perguntou.
- Isso o que? – Perguntei, mas antes dele responder eu o vi olhando na direção dos dois, eu entendi o que ele quis dizer.
- Claro que vai! – Exclamei.
- Quem vai olhar para mim, um gay afeminado, eu sou patético Fabrício, eu só sirvo para trabalhar com moda e foder com tarados estranhos nos banheiros da vida e... – Olhei para ele, essa última informação era nova.
- Wow, calma aí... – freei ele – o fato de sermos gays não nos impede de amar e ser amados, na verdade o fato de ser gay não justifica tal pensamento – franzi a testa – temos o direito de amar qualquer um, se casais heterossexuais podem por que não podemos, direitos iguais meu caro, estamos na Europa - ele riu.
- Você é engraçado, um pouco sério, mas é engraçado – ele disse um pouco envergonhado.
- Obrigado – sorri – então, me fala o por que dessa cara de velório Pablo? – Ele me olhou e suspirou.
Como eu era uma pessoa mais velha e sensata eu dei espaço para ele se abrir comigo, esperava que ele estivesse totalmente confortável.
- Acho que eu devia ser mais machinho... – Olhei surpreso para ele após esse comentário.
- Por que isso agora? Você não acha que está muito esclarecido para isso? – Perguntei tentando entender.
- Por que é evidente que eu incomodo as pessoas com o meu jeito – revirei os olhos, tinha uma rainha do drama prestes a atuar.
- As pessoas ou o Rick? – Ele me olhou assustado – você não deve mudar por causa dos outros, não deixe de ser você mesmo, não use a razão, use o coração, deixe que os incomodados que se explodam...Fazer o que os outros querem só para não incomodar é coisa de gente ignorante – Ele suspirou.
- Eu sou gay, fato, eu sou afeminado, fato e sou um ser humano com sentimentos Fabrício, eu sei que as pessoas riem e debocham de mim – ok, ele queria desabafar.
- Ninguém tem o direito de apontar o dedo e julgar, ninguém nasceu para ser igual ao outro ou seguir estereótipos... – ele parou, pareceu surpreso com o que disse.
- Como você sendo gay é tão machinho assim? – Me questionou – você podia me ensinar a ser assim... – Interrompi ele.
- Nunca! - Exclamei achando um pouco absurda essa idéia - por que eu iria te ensinar a ser algo que você não é só para agradar um ou dois?Pablo, devemos ser autênticos e não ser Maria vai com as outras, não devemos olhar para fora e sim para dentro, somos o que somos e ninguém tem o direito de mudar isso, ninguém! – ele me olhou de olhos arregalados – e quanto a eu ser machinho acho que vem da minha personalidade, não devemos seguir um estereótipo e é ofensivo pensar que todo gay tem que ser de um jeito... - ele me olhou confuso.
- Não entendi... – ele franziu a testa. Era hora de explicar a ele.
- Como você descobriu que era gay? Ou melhor, como se aceitou? – ele pensou e pensou.
- Foi quando eu tinha uns 14 anos – ele riu – meu pai começou a notar meu jeitinho mais delicado, eu era mais educado que meus irmãos e via as meninas como amigas e não como namoradinhas, ele preocupado me levou com ele para uma viajem – ele me olhou e riu descaradamente – ele tem uma fazenda de criação de gado próximo a Tucuman e nas férias daquele ano eu conheci Ruan, o capataz, foi estranho, mas senti algo dentro de mim, eu não tinha entendimento, mas sabia que não poderia ser normal, eu admirava ele, passei a conviver com ele de perto, ele me tratava bem, era como se fosse um irmão mais velho, na época ele devia ter uns 21 anos nais ou menos...– Pablo mordeu os lábios.
- Ele foi seu primeiro homem? – Perguntei.
- Foi – ele sorriu, era um sorriso nostálgico – ele me pegava de jeito, sabia me domar, mas tudo que é bom dura pouco, ele foi para um rodeio, caiu do cavalo e quebrou o pescoço, namorávamos em segredo, só meu pai e seu tio sabiam... – ele me olhou consternado.
- Sinto muito... – ele assentiu.
- Na verdade eu era a sua putinha particular, ele iria casar e de qualquer jeito eu ia sempre ser o amante...Não queria isso, minha idéia era terminar com ele, não seria nenhuma válvula de escape – senti uma fisgada no estomago e quase instintivamente o abracei.
Pablo então começou a chorar, mas não era por causa da história, era algo grave e que estava incomodando ele.
- Me conta o que está acontecendo, se você quiser minha ajuda vai ter que confiar em mim... – ele me olhou e assentiu, seguimos até uma praça e sentamos em um banco.
- Promete não brigar comigo, não arranjar confusão e não contar a Enola e nem ao Marcelo? – Pelo jeito era grave.
- Depende, se for algo muito grave terei que contar... – ele então fechou a cara e se levantou.
- Eu sabia que não podia confiar em você e... – Interrompi ele.
- Senta nessa porra desse banco e me conta o que está acontecendo, senão eu vou ligar para seu pai na em Buenos Aires para ele vim para cá e descobri o que está acontecendo contigo... – ele me olhou assustado , então se recompôs e sentou do meu lado.
- Há mais ou menos duas semanas eu precisei de voluntários para um teste de roupas que teria que ser apresentado aos professores das disciplinas de costura e estilo... – ele me olhou apreensivo.
- Continua... – incentivei ele.
- Acontece que a gente não escolhe os voluntários, eles mandam de acordo com o perfil estabelecido pelos professores, só ficamos sabendo quem é na hora que eles se apresentam para gente e só na hora de tirar medidas e tal... – Franzi a testa, não entendia onde ele queria chegar.
- Peraí, isso foi no dia que você chegou bem mais tarde né? – Ele ficou vermelho.
- Sim... – Ele desviou o olhar do meu – quase cai quando descobri quem era os meus voluntários, era o Rick e o Andrei, um intercambista russo de Moscou... – ele me olhou estranho e eu comecei a entender.
- E o nosso coleguinha foi mal-educado e sem noção, foi isso? – Perguntei a ele.
- Até tentei trocar, mas parece que eles estavam ali obrigados, segundo a nossa professora eles tinham que conseguir créditos extras para seus relatórios e por que tinham o estereótipo que era pedido... – ele então se calou.
- Continua... – ele então olhou para os lados como se estivesse com medo.
- Aquela noite eu demorei por que os meus voluntários não colaboravam, na verdade a maioria ali estava tentando dificultar nosso trabalho, por isso que se vestem como se a avó tivesse escolhido suas roupas – comentou frustrado, eu simplesmente ri – foi uma tortura Fabrício, eles não paravam quietos, debochavam, os monitores tiveram que interferir algumas vezes e com muitos custo eu consegui vestir eles – ele sorriu - quando eu fui até o provador ver se havia ficado alguma peça para trás ou até mesmo alguém da turma notei que estava tudo quieto, me virei e quando ia sair Rick estava parado me encarando e impedindo a passagem... – sua voz falhou – ele me encarava com ódio, com deboche, eu sabia que ele não ia deixar barato o fato de ter que servir de modelo...ainda mais para alguém como eu... – Ele se calou.
- Vai me dizer que... – Ele não me encarou.
- Ele me humilhou, me chamou de bicha rameira, de veadinho costureiro e que devia ter me dado uma surra quando eu o toquei com minhas mãos imundas, disse que ia fazer da minha vida um inferno, que era bom eu trancar a porta senão ele ia... – Interrompi ele.
- O que mais ele fez? – Perguntei.
- Ele me bateu – Baixou a cabeça e assentiu.
- Filho de uma puta! – exclamei com ódio – você não podia ter deixado ele fazer isso devia ter falado com seus professores... – Ele me não me encarou.
- Não foi só ele e não foi só isso... – ele olhou ao redor.
- Tem mais? – Ao longe vi Marcelo e Enola acenarem indo para casa, ela percebeu algo errado e quis parar, mas eu fiz sinal para continuarem.
- Tem... – ele me olhou envergonhado.
Olhava para Pablo com os olhos arregalados, por sua vez ele estava de cabeça baixa, encarando o chão e calado, suas lágrimas haviam secado.
- Pablo, o que ele sente por você não é ódio... – após pensar muito eu resolvi dizer a ele, cheguei a essa conclusão.
- Não! – Exclamou.
- Não, ele não te odeia – Ele me olhou como se eu fosse louco.
- É pior que isso... – sua voz saiu com pesar, ele apoiou a cabeça no banco e fechou os olhos.
- O Rick é o perfil exato de um enrustido... – ele me olhou surpreso.
- Enrustido?! – Ele franziu a testa.
- Sim, um filho de uma puta de um enrustido, conheço um de longe – disse lembrando do meu primo Maxuel.
- Ele me odeia, odeia você, odeia todos os gays do mundo, não gosta dos nerds, não pode Fabrício... – interrompi ele.
- O Rick tem raiva de você, tem raiva de mim, mas na maior parte das vezes nos atura, certo? Ele até faz questão de sentar de frente para você, eu sou bom em observar Pablo, o foco de tudo é você, mas eu não entendo o porquê desse ódio, dessa implicância, eu acho que isso é amor... – Ele franziu a testa.
- Nem brinca com isso Fabrício... – Ele me encarou, olhei para ele e continuei explicando tudo sobre enrustidos.
- O fato de eu ser gay não o incomoda tanto, deve ser por que eu não transpareço tanto, mas o fato de você ser gay e ter um jeito afeminado o tira do sério... – Pablo me interrompeu.
- Mas... – interrompi ele quando olhei para a rua vi quem apareceu no meu campo de visão como se tivesse se materializado no meio da escuridão.
- Oi Fabrício... – essa voz me arrepiava.
- Quem é? Você o conhece Fabrício? – Perguntou Pablo envergonhado.
- Luciano! – Exclamei surpreso, acho que sanei a dúvida dele. Um sorriso se formou em seu rosto, quando notei eu estava sorrindo, ele então veio em minha direção, ele usava um casaco de lã azul escuro, um cachecol preto e jeans, suas insuperáveis botas de lenhador e um gorro que o deixava com cara de gângster gostoso.
- Eu não disse que vinha te ver... – Então como se tudo tivesse parado ou perdido a graça eu me levantei e o abracei, ele então me apertou, me beijou ferozmente e me pegou no colo onde eu entrelacei minhas pernas em sua cintura e abraçados nos tornamos um só.
* Galera, peço desculpas pela demora, houve alguns contratempos e não tive como postar antes. No mais boa leitura.