Thithi et moi, amis à jamais! Capitulo 157
Eu não saia do hospital, foi uma semana em que eu ia todos os dias e ficava vigiando o Bruno. Ele não apresentava melhora, eu entrava no quarto dele e o observava. Eu não queria acreditar no que estava acontecendo. Eu toquei no rosto dele e estava frio, ele já não tinha mais a temperatura normal. Eu sentia o que aconteceria, eu só não queria acreditar...
Todos os dias alguém vinha vê-lo. A Sophie passou a semana inteira com a Mamam eu quase não via minha filha o que a fez sofrer, pois ela era muito apegada a nós. Num determinado dia, eu fiquei um pouco com ele e como a Mamam veio ve-lo nesse dia, eu saí do quarto e ela entrou lá com ele e eu fui para a sala de espera. Após a saída da Mamam, eu continuei na sala de espera. Eu estava “tranquilo”, já não mais chorava. Eu encostei minha cabeça na parede e fechei meus olhos, e senti o cheiro dele, senti a presença dele como nunca tinha sentido. Eu soube ali naquele momento que o que eu temia havia acontecido. Lágrimas desceram calmamente dos meus olhos.
Eu senti uma mão no meu ombro.
- Antoine? – Umberto me chamou
- Oi? – Minha voz estava fraca, quase não se dava para ouvir
- Eu... eu...
- Eu já sei, Umberto. – As lágrimas ainda desciam desesperadamente sem parar
- Ele se foi, Antoine. – Ele se segurava para não demonstrar emoção, ali ele era médico, ele não era nosso amigo naquele momento.
Todos vieram o mais rápido possível para o hospital. Os meninos chegaram chorando. O Thi me abraçou forte e chorou. Eu estava em outro plano, eu chorava, eu sofria, mas era tudo calmo. Eu sou espirita, eu vejo a morte de outra maneira. Quando eu estive com ele no quarto, eu soube que a missão dele tinha acabado. Eu soube que eu teria que continuar sozinho a partir daquele momento. Eu sabia que eu continuaria amando ele eternamente. Eu sabia que um dia nós nos encontraríamos novamente. Ele foi feliz, ele me fez feliz. Mas era hora de partir, e eu precisava deixa-lo partir... Eu só não sabia se eu conseguiria...
Papa cuidou de tudo a partir daquele ponto. Eu fui para casa, eu precisava falar com o irmão e a mãe dele que ainda não sabiam de nada. Eu precisava abraçar a minha filha, a NOSSA filha. Eu sentia a presença dele constantemente, ele sabia que eu estava sofrendo e eu sabia que ele estava ali. Nós acreditamos que o espirito tem um certo tempo no plano terrestre para se desapegar, não é como os filmes mostram. Quando a gente morre não vem uma luz do além e leva a gente. Nós ficamos aqui ainda, às vezes muitos espíritos nem sabem que precisam ir.
Chegando em casa eu fiz minha oração. Eu pedi para que os espíritos de luz guiassem o Bruno, pedi ao Bruno que desapegasse desse plano, que era hora de partir. Era hora de ir para o mundo espiritual continuar o aprimoramento lá. Pedi para que ele fosse em paz, eu ficaria bem. Eu sofreria como qualquer outra pessoa, mas eu entendia que ele precisava ir. Eu entendia que nossa missão tinha chegado ao fim. Eu pedi discernimento aos espíritos, pedi ajuda nesse momento tão difícil. Eu precisava me desapegar dele também, por mais difícil e doido que fosse. Eu precisava deixa-lo ir...
Meu coração doía de um jeito que eu nunca havia sentido antes. Eu sentia meu corpo inteiro reagir a tristeza que eu sentia. A dor me dilacerava por dentro. Mas eu já havia parado de chorar. Eu tinha que cuidar da minha filha. Éramos nós dois contra o mundo, agora. Ela precisava de mim, eu não podia fraquejar. Eu tinha que sofrer por dentro, pois por fora eu tinha que ser forte, por ela, pelo menos era o que minha cabeça dizia.
Eu nunca sofri tanto como naquela época. Sophie foi minha salvação, sem ela eu teria enlouquecido. Sem ela, eu teria ido junto com ele. A dor que eu sentia era algo inacreditável que só quem já passou por isso é capaz de entender.
Eu estava sentado na sala, Sophie estava brincando na minha frente, eu olhava para o nada.
- Amigo, como tu estás? – Jujuba falou comigo, ela se controlava para não chorar na minha frente
- Oi, Ju! – Minha voz era suave – Ele se foi, Ju.
Ela me abraçou e chorou.
- Eu preciso ligar para o Jean e a mãe dele.
- Tua mãe já fez isso.
Eu fiquei calado. Não tinha vontade de falar e nem sabia o que falar.
Meus pais cuidaram de tudo para o enterro. Eles não deixaram eu cuidar de nada. No outro dia seria o velório. Todos vinham falar comigo e eu pouco falava. Eram sempre respostas monossilábicas.
Às vezes eu ouvia a voz dele perto de mim, eu sabia que era minha imaginação. Eu lembrei de nós dois no carro no dia do acidente. Ele me beijou com tanta vontade e disse que me amava. Naquele momento eu já sabia que algo aconteceria, por que eu não escutei meu coração? Eu poderia ter tudo evitado... Nessas horas a gente pensa em tantas loucuras...
Eu queria deixa-lo ir, mas meu coração queria ele perto de mim. Eu queria ser forte, mas eu fraquejava. Eu não entendia mais nada.
- Antoine – Thi me tirou do meu devaneio – vem comer algo.
- Eu não quero.
- Tu precisas comer algo, vem.
- Não quero!
Eu continuei a ver a Sophie brincar.
- Mano, vem comigo. – Dudu apareceu
- Oi, mano!
- Vem comer algo, eu tô preocupado contigo. Tu não comes nada desde ontem.
- Eu tô bem! Não tô com fome.
Ele ficou sentando ao meu lado por algum tempo, às vezes ele falava comigo, mas eu nem respondia.
Eu comecei a pensar que nenhum dos nossos sonhos seriam mais realizados. Nós não faríamos a viagem que queríamos fazer, não conheceríamos juntos todas as cidadezinhas francesas, não teríamos o nosso segundo filho. Planos e mais planos nós fazíamos, tínhamos uma vida feliz inteira pela frente, nós pensávamos. Se nós soubéssemos quão breve ela seria, nós teríamos aproveitado mais. Ele não estava mais lá comigo. Foi tudo tão rápido. Como as pessoas partem tão rápido? Por que elas têm que partir? Por que eu não fui junto? Por que eu tive que ficar e sofrer tudo o que eu estava sofrendo? Por que eu não fui primeiro? Era para eu ter morrido de câncer, D-E C-A-N-C-E-R. Eu tinha 95% de chances de morrer. Por que eu não morri? Por que ele teve que partir antes de mim? Acidente de carro? Por que? Ele sempre dirigiu tão bem...
- Filhote - Papa chamou minha atenção – vem com o Papa vem.
- Eu não quero comer, Papa.
- Mas tu precisas, meu filho.
- Obrigado, não quero.
Eu cuidava da Sophie, não deixava ninguém cuidar e nem carrega-la. Ela me mantinha sã. Ela me mantinha conectado a ele. Eu passei aquela noite inteira em claro, vigiei todo o sono da Sophie. De manhã seria o velório. Tudo estava sendo tão rápido, eu não sentia o tempo passar por mim. De repente, eu me vi de frente para um caixão. Um caixão que levaria o amor da minha vida para o fundo da terra. Ele estava bonito. Eu o vi. Eu o beijei. Eu chorei. Eu sentia a falta dele mais do que qualquer outra coisa. Eu queria, eu queria muito não sentir. Eu queria muito, muito mesmo aceitar o que eu sabia. Era uma passagem. Ali era só o corpo dele. Mas, era aquele corpo que estava comigo o tempo todo. Era ele quem dormia e acordava comigo. Como eu não sentiria a falta do homem que eu amava? Como deixa-lo ir sem sentir nada disso?
Eu não saí de perto do caixão em nenhum momento. O irmão e a mãe vieram vê-lo e se despedir. Eles choravam demais. Ambos me abraçaram. Muita gente me abraçou, eu não sabia o que falar. Então, eu não falava nada com ninguém. Eu entrei em um silêncio profundo a partir daquele momento.
A hora da despedida havia chegado. Estávamos no cemitério, eu estava com a Sophie no colo. Estávamos longe de todos, não aguentava mais ninguém falar comigo, me perguntar se eu estava bem, se eu precisava de algo. A vontade que eu tinha era de gritar: EU NÃO TÔ BEM, IDIOTA! E SIM, EU PRECISO! EU PRECISO DO MEU MARIDO COMIGO.
- Oi! – Alguém falou comigo, eu me arrepiei por inteiro
Ele estava todo de branco. Era um senhor.
- Acalma esse coração, meu filho. Não sofra tanto. Você entende esse processo, eu sei disso. Você sabe que não é a primeira e nem será a última vez que vocês se encontram. Ele está bem. Você precisa ficar bem também.
- Eu sei... – eu senti minhas lágrimas descerem
- Essa mocinha precisa de você. Ela será muito amada, não será?
- Será, sim!
- Não sofra tanto! – Ele colocou a mão no meu peito e se foi
Eu chorei, chorei por que eu sabia que eu não veria mais o Bruno. Chorei por que não sabia o que eu faria com todo o amor que eu sentia por ele. Não sabia o que eu faria da minha vida.
- Vem cá, vem! – Thi disse me abraçando quando me encontrou – Tu sabes que eu estou aqui, né? Tu sabes que tu podes contar comigo, não sabes?
Eu não falei nada, ele me abraçou meio sem jeito, afinal eu estava com a Sophie no colo. Thi me levou de volta para onde estavam todos. Bruno já havia sido enterrado. Nós fomos para o carro do Papa.
- Me deixe em casa, Papa.
- Nós vamos para casa, filhote.
- Não, me deixe na minha casa.
- Antoine, não.
- Eu quero ir para a minha casa Papa. Me deixe lá, por favor.
- Meu filho...
- Por favor, Papa...
Ele me levou para casa. Ele não queria me deixar sozinho, mas Dudu e Pi falaram que ficariam de olho em mim. Ele aceitou relutante e foi embora. Eu entrei em casa e disse para os meninos irem para a casa deles, eu ficaria bem sozinho. Eles contestaram, mas no final eu consegui fazer com que eles entendessem. Eles disseram que viriam sempre ver como eu estava. Eles me abraçaram e foram para a casa.
Eu olhei para a Sophie e ela sorria para mim. Eu não sorri de volta para a minha filha, eu não conseguia sorrir. Parecia que toda a felicidade havia sido sugada do meu corpo. Eu sentia um vácuo gigantesco dentro de mim, a única coisa que habitava em mim eram a solidão e a tristeza. Minha dor era tão grande que eu só queria ficar quietinho. Não queria falar com ninguém, não queria ver ninguém.
Eu fui para a cozinha, fiz algo para a Sophie comer. Eu dei para ela e subimos para o quarto. Eu a fiz dormir e fiquei acordado. Eu não conseguia dormir. Eu olhei para aquele quarto e me veio uma dor tão grande, tão grande que é como se tivessem me partido ao meio com uma espada. Eu olhei para as coisas dele e lembrei que ele nunca mais usaria. Eu sentia o cheiro dele ainda no quarto. Aquele cheiro aos poucos ia sumir...
Eu peguei as roupas dele e joguei algumas no chão. Eu sentei, as abracei e chorei. Eu sentia a falta dele, sentia falta dele implicando comigo, dizendo que me amava, me chamando de mozão. Eu nunca mais o beijaria, nunca mais sentiria o corpo dele contra o meu. Ele nunca mais me falaria indecências, nunca mais diria que me amava. Nunca mais chegaria em casa pedindo massagem, nunca mais o veria enganar nossa filha a fazendo andar atrás dele pela casa. Ele não veria a filha crescer e ela não conheceria o pai maravilhoso que ele era. Ele não poderia cumprir a promessa de ser o melhor pai do mundo. Tudo isso era culpa de um idiota que havia bebido e resolvido dirigir. É incrível como pessoas do bem sempre pagam pelas inconsequências de pessoas do mal. Ele tinha ido embora por culpa de um idiota que invadiu a contra mão. A colisão entre os carros foi tão grande, que nenhum dos dois sobreviveu. O cara vinha em altíssima velocidade, Bruno não teve tempo nem de desviar.
Era isso, eu estava sozinho em um quarto escuro chorando no chão, abraçado às coisas do homem que eu amava. Eu sofria sozinho. Eu não queria falar com ninguém. Eu passei a noite daquele jeito. Toda vez que eu fechava os olhos eu via o Bruno, aquilo me angustiava. Pela manhã, quando a Sophie acordou eu cuidei dela como eu fazia todos os dias. Mas, nesse dia eu não tinha o Bruno para me ajudar.
Eu lembrei que a algumas semanas nós tínhamos brigado por ele não estar me ajudando. Como eu queria retirar tudo o que eu havia dito a ele. Como eu queria ter falado realmente o que eu sentia. Como eu queria ter dito que ele era a única pessoa que me fazia plenamente feliz, que sem ele eu não saberia viver. Queria ter dito que ele era o melhor cara que eu havia conhecido em toda a minha vida, que ele era o melhor pai que eu conhecia. Eu queria dizer para ele tantas coisas...
Eu dava banho na Sophie quando o Dudu entrou no quarto.
- Mano?
- Oi!
- Ta tudo bem?
- Unrum.
- Tu já comeste?
- Não!
- Eu trouxe café pra ti.
- Unrum.
Ambos ficamos em silêncio. Eu saí do banheiro sequei a Sophie e a arrumei. Desci, preparei o café dela e dei a ela. Eu não comi, mesmo o Dudu insistindo para eu comer. Eu não sentia fome.
- Antoine, há dois dias que tu não comes. Tu precisas comer, mano.
- Não, obrigado!
Ele ficou me olhando por um tempo e depois saiu. Coloquei a Sophie para brincar e fiquei olhando. De dez em dez minutos vinha alguém ver como eu estava e se eu tinha comido. Eles vinham tantas vezes que eu já nem falava mais nada. Em um determinado momento do dia, o Thi trouxe uma sopa e me fez comer.
- Antoine, tu vais comer nem que eu tenha que abrir a tua boca e enfiar goela a baixo.
- Eu não to com fome!
- Mas tu vais comer do mesmo jeito.
Eu tomei a sopa. Quando eu terminei de tomar eu saí correndo para o banheiro. Eu vomitei tudo logo em seguida. Meu estomago não aceitava nada. Meus amigos estavam muito preocupados comigo. Eles faziam turnos me vigiando. Eles já nem falavam mais nada, pois sabiam que eu não respondia.
Sete dias já haviam passado. A mãe e o irmão dele resolveram fazer uma missa de sétimo dia e me chamaram. Eu fui. Fui, mas não deixei ninguém me ver. Eu sentei lá no fundo. Todo mundo estava bem emocionado. Todos os nossos amigos estavam lá. Antes de terminar a missa eu sai e voltei para casa. Eu não saía para nada. Eu não ia na escola. Não ia a lugar algum. A única coisa que eu fazia era cuidar da Sophie, por que nem de mim eu cuidava. Era raro eu comer, muitas vezes o que eu comia eu vomitava. Eu emagreci drasticamente nesses sete dias. Minha expressão era de doente. Eu não via animo para nada, eu não me arrumava. Agora, a Sophie vivia sempre muito bem arrumadinha. Eu cuidava dela como se nada tivesse acontecido, eu sabia que ele gostava quando ele a encontrava toda linda.
As vezes eu olhava para a porta e vinha uma esperança tão grande dentro de mim, uma esperança de vê-lo entrar pela porta, me beijar e me dizer que foi tudo um sonho. Tudo na casa me lembrava dele, tudo na casa me fazia sofrer. Mas, tudo na casa me lembrava dele, tudo na casa me fazia estar perto dele. Meus pais sempre vinham e tentavam me levar para a casa deles, mas eu sempre recusava. Eles só me deixaram em casa, pois meus amigos estavam sempre lá.
O Thi sempre planejava e corrigia as provas dele lá em casa. Ele me contava tudo o que acontecia na escola. Eu não reagia a nada. O Pi e o Dudu sempre cozinhavam para mim, mas eu nunca comia. A Jujuba sempre vinha e me contava do bebe, a barriguinha dela estava começando a aparecer. Jean e ela se casariam. Ele viria morar no Brasil, pois ela disse que não iria de jeito nenhum deixar todos os amigos dela para ir morar na França. Ele ficou louco de felicidade quando soube que teria um filho. Ele sempre vinha me visitar também, pois ele já passava mais tempo aqui do que em Guyane ou na França. Anne e Gui sempre vinham me fazer companhia também, eles me contavam todas as fofoquinhas da escola. Ela sempre me trazia as cartinhas que meus alunos faziam para mim e mandavam por ela. Eu recebia visitas o tempo todo de pessoas da escola, da época da universidade, do hospital. Os amigos dele sempre vinham me ver. Todos estavam preocupados comigo. Eles viam eu definhar na frente deles. Minha Mamam e minha tia Joana sempre vinham me ver também, elas estavam preocupadas, elas já tinham me visto em um estado parecido com esse quando eu tive câncer pela primeira vez. Papa vinha TODOS os dias, e TODOS os dias tentava me levar para a casa dele.
A verdade é que eu não tinha mais ânimo para viver. Um mês havia se passado, eu havia pedido desligamento da escola. Eu não voltaria para lá. Eu não saia de casa, o máximo que eu saia era até o jardim, e isso só por que a Sophie precisava pegar sol.
Eu fiquei dois meses nesse estado, eu pouco comia. Só comia para sobreviver, então, eu estava com um aspecto cadavérico. Eu sentia a mesma dor todos os dias, era como se eu fosse torturado. Eu sentia alguém me cortar ao meio todos os dias. Havia um buraco dentro de mim que não era preenchido por nada.
Um determinado dia, o Thi veio me fazer companhia. Era mais ele quem conseguia me fazer comer, então, eu comi enquanto ele me contava que meus alunos estavam se organizando para me fazer uma visita em massa. Eu não demonstrava nenhuma emoção. Ele corrigiu o que tinha para corrigir e depois nós assistimos televisão juntos. Eu não disse uma palavra sequer.
Após a visita do Thi, três dias se passaram. Era uma quinta feira, vários carros começaram a estacionar na frente da minha casa e vários moleques de uniforme igual começaram a descer. Todos os meus alunos foram me ver. Minha casa não tinha espaço de tanto moleque junto. Eles me abraçavam e tentavam me fazer rir. Eu me senti tão amado, me senti bem. Mas, eu não sorria, eu não sabia mais fazer isso. Eles levaram cartinhas e lembranças para mim. Desejaram as melhores coisas e falaram que me esperavam na escola, falaram que eu precisava voltar, pois a nova professora era chata demais. A diretora disse que minha vaga sempre estaria a minha disposição. Eles passaram uma tarde comigo. Quando eles foram embora, a tristeza e a solidão voltaram para dentro de mim.
Eu sentia como se só eu existisse no mundo. Eu sentia como se ninguém me amasse e como se EU não tivesse mais a capacidade de amar. Eu pouco dormia, pois toda vez que eu fechava os olhos eu sempre o via. Naquela noite eu dormi e sonhei.
- Não sofra tanto, meu filho! – era o mesmo velhinho que falou comigo no cemitério
- Eu não quero mais viver – Eu disse
- Se você não quer mais viver, quem cuidará da Sophie?
- Meus pais cuidam dela.
- A missão é de vocês!
- Eles cuidam dela! – Eu insisti
- Ela só é feliz com você!
- Não, não! Ela é feliz com eles também! Deixa eu morrer?
- Isso não depende de mim, meu filho. Mas pense, quem a pegou no colo pela primeira vez? Você realmente acha que ela será feliz sem você? Ela só tem vocês. Cuide dela.
- Eu já estou cuidando.
- Você só está cuidando da matéria, isso qualquer um faz...
- Mas ela tá bem, não tá?
- Ela precisa de amor, meu filho.
- Eu não tenho mais isso... Por isso meus pais podem cuidar dela.
- Não! Tu tens amor sim! Nunca esqueça que você é especial.
Eu acordei com a Sophie chorando. Ela quase nunca chorava dormindo, ela estava ao meu lado. E a peguei no colo e a acalmei. Ela ficou deitadinha no meu colo e ficou olhando diretamente nos meus olhos. Eu sabia que ele estava certo, ela precisava de mim. Mas, eu não tinha mais o que ela precisava. Eu a fiz dormir novamente, mas eu não consegui mais.
Os dias iam se arrastando por mim. Eu continuava pouco comendo e pouco dormindo. Meus amigos e minha família já não aguentavam mais. Dudu e Pi praticamente voltaram a morar comigo. Eles me fiscalizavam dia e noite. E foi assim que eles descobriram que eu não estava dormindo também. Todos me forçaram a ir a um psiquiatra. A contragosto eu fui. Ele me receitou remédios para dormir e remédios para aumentarem meu apetite. Eu estava em uma profunda depressão. A vida, para mim, não tinha mais nenhum sabor, nenhum odor, nenhuma cor. Eu só vivia esperando o dia para morrer, pois eu era tão covarde que não tinha coragem de encerrar minha própria vida, também era o que eu pensava. Se eu tive vontade? Todos os dias! Todos os dias eu levava uma faca para dentro do banheiro, mas eu não tinha coragem de usá-la.
Os meninos fiscalizavam para saber se eu estava tomando os remédios direitinho. E eu estava. Com o passar dos dias, eu já conseguia dormir. Eu não sonhei mais com o velhinho e nem vi mais o Bruno. Eu comia, mas nada tinha sabor. Eu ainda sentia uma dor sem fim. Eu queria parar aquela dor, mas não sabia como. Eu ainda sentia um buraco enorme dentro de mim. Eu ainda sentia a solidão e a tristeza me devastarem.
Um determinado dia, o Thi apareceu em casa e me tirou de lá a força praticamente. Ele não queria deixar a Sophie vir, mas eu disse que sem ela eu não iria a lugar algum. Ele nos levou à Orla, era final de tarde. Ele pegou a Sophie no colo, pois eu não estava aguentando ficar com ela muito tempo no colo. Eu estava pele e osso. Como pode uma vida ser desfeita tão rapidamente? Eu tinha marido, tinha trabalho, tenho minha filha, era feliz. Em um dia eu perdi quase tudo.
Thi passeou com a gente, me fez tomar sorvete. Ele fazia a Sophie dar boas gargalhadas. Nem ver minha filha feliz me fazia feliz. Eu comecei a me questionar se eu realmente era importante, aqui. O Thi fazia a Sophie feliz, meus pais a faziam feliz. Ela ficaria em boas mãos. Eles não precisavam de mim. Eu não me encaixava mais nessa vida, eu não me via mais vivendo como antes. Eu não me via sorrindo, eu não via motivo para isso. Eu não me via mais feliz, não tinha mais quem me fizesse feliz. A família que eu tinha construído tinha se desfeito. A felicidade que eu tinha construído arduamente, havia acabado.
Eu não falava. Provavelmente já havia até perdido essa capacidade. Eu havia me acostumado a ficar em silêncio. Não tinha com quem eu falar, não havia mais ninguém para eu partilhar minhas alegrias e minhas tristezas. Tudo acabou.
Nós fomos para casa. Eu deixei a Sophie no chiqueirinho. Antes do Thi ir embora, ele me abraçou.
- Volta pra gente! – Ele disse chorando – Eu não aguento mais te ver assim, Antoine. Eu sei o quanto tu estás sofrendo. – Ouvir isso me fez sentir tanta raiva, mas tanta raiva.
- TU SABES O QUANTO EU TÔ SOFRENDO? NINGUÉM SABE O QUE EU ESTOU SOFRENDO. NINGUÉM SABE O QUE EU ESTOU SENTINDO. EU NÃO TENHO NINGUÉM. EU NÃO TENHO COM QUEM FALAR. EU ESTOU SOZINHO. EU NÃO TENHO NENHUM MOTIVO PARA VIVER. ME DEIXEM EM PAZ. PAREM DE FICAR VINDO AQUI DE DEZ EM DEZ MINUTOS. PAREM DE ME PERGUNTAR SE EU TÔ BEM. EU NÃO TÔ BEM, OK? O CARA QUE EU MAIS AMEI NESSE MUNDO MORREU. MORREU E EU NÃO PUDE NEM ME DESPEDIR. ELE SE FOI. ELE ME DEIXOU. EU TO SOZINHO. ME DEIXEM. – Ele me abraçou forte
- ME DEIXA! ME LARGA! – Eu dizia batendo nele
- Eu não vou te deixar! – Ele me abraçava mesmo eu batendo forte nele – Tu não estás sozinho, Antoine. Tu tens a mim. Eu sempre vou estar aqui contigo. Tu tens o Dudu, o Pi, a Jujuba, toda a tua família. Volta pra gente.
- ME LAAAAAAAAAAAAAAAARGAAAAAAAAAAAAAA!!!! – Eu o empurrei para longe
- O que está acontecendo? – Dudu apareceu
Eu corri para o meu quarto e me tranquei lá. Eles bateram na porta, mas eu não atendi. Eu não queria mais viver. Eu não queria mais ouvir ninguém me perguntar coisas idiotas. Eu respirei fundo e fui para o banheiro.
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Oi, gente! Desculpem-me pelo sumiço nos ultimos dias, mas infelizmente eu estava (e ainda estou) encontrando dificuldade para escrever esses capítulos. Infelizmente, eu não consegui contar com riquezas de detalhes, por dois motivos. 1: aquela época passou por mim sem que eu percebesse, eu vivia, mas é como se tudo fosse um sonho. 2: dói demais lembrar de tudo isso.
Eu sei que muitos me perguntaram se ele realmente havia partido. Eu não podia responder naquele momento... Eu saltarei algumas datas, não contarei algumas coisas, pois eu realmente não consigo. Eu sei que muitos podem pensar que é frescura, mas entendam: é a minha vida. Isso ainda dói. Desculpem-me...
Só mais uma coisa, haverão partes em que eu terei que contar algo que envolva minha religião. Quem não acredita, pule a parte. Não tem como eu evitar.
Boa noite a todos! Até amanhã!