CAPÍTULO 24
Cahya foi impedida de se aproximar de Milena por Na-Hi que teve que lutar com ela chegando até mesmo a jogá-la no chão e imobilizá-la, mesmo se sentindo péssima ao fazer isso.
Também não adiantou nada a correria. Milena continuava imóvel em seu leito e Ernesto chegou até mesmo a censurar Diana por dar a ele falsas esperanças. Diana jurava que tinha visto a garota se mover, frisando que as pálpebras de seus olhos tinham tremido. Foi necessário que Pâmela afastasse Ernesto de perto de Diana para evitar que o clima piorasse.
A noite chegou e foi embora sem que houvesse qualquer mudança no estado de saúde de Milena, mas o dia começou agitado em virtude de Ernesto insistir que deveriam decidir que castigo dar à Cahya por causa de seu crime. Depois de muita discussão, onde ele insistia que a garota devia ser banida da Enseada e Na-Hi ser contra essa medida alegando que separar Cahya dos demais habitantes da ilha era o mesmo que condená-la a morte, chegaram a um consenso onde a garota teria que viver na Praia dos Tubarões e o limite seria o lago. Ou seja, Cahya poderia ficar em qualquer lugar da ilha que se situasse ao norte da Enseada e jamais poderia cruzar o lago em direção ao local onde os outros viviam. Mas ela contaria com ajuda e assistência dos demais para conseguir alimentos e receber proteção, sempre que necessário.
Outra exigência de Na-Hi, sendo esta aceita, era a de que o Ernesto não poderia julgar a Cahya e, depois de muita discussão onde ninguém aceitou assumir a função de juiz, decidiram que fariam uma votação, porém, nessa votação, estariam proibidos de votar o Ernesto, pelo motivo já exposto, a Cahya por ser a pessoa a ser julgada. Assim, os votantes que selariam o destino da garota eram em número de seis com cada um deles justificando seu voto.
Iniciado o julgamento, Henrique foi o primeiro a votar e optou pela absolvição, justificando que essa foi a primeira falha de Cahya e que ela merecia uma nova chance. Nestor votou pela condenação alegando que o caso deveria servir de exemplo para evitar novos crimes. Margie, depois de dizer que Cahya deveria ser absolvida, principalmente por ser uma ótima cozinheira e não tinha como substituí-la naquela tarefa, provocando o protesto de alguns a acusando de nunca levar nada a sério, ela se defendeu:
– Lógico que não levo a sério. Quem somos nós para julgar alguém? Todos cometemos erros e condenar a Cahya agora nos dará a responsabilidade de condenar qualquer um que no futuro cometa algum ato que cause problemas aos demais.
Todos ficaram boquiabertos com o argumento da ruiva. Todos menos Pâmela que disse ao ouvido de Ernesto:
– Eu não te disse que essa menina é muito mais responsável do que aparenta?
Ernesto apenas dirigiu à esposa um olhar atravessado e não disse nada. Tudo o que ele queria naquele momento era a condenação de Cahya, pois ele achava que sua filha só estaria protegida no caso dela ficar longe de sua filha.
Em seguida foi a vez de Diana que usou o argumento que Ernesto usaria. Eles já tinham conversado a respeito disso e ela fora convencida que Cahya representava um perigo para Milena. Na-Hi, apesar de demonstrar enorme sofrimento por sua decisão, se uniu aos que desejavam a condenação.
A sorte de Cahya estava selada. Até então, três votos eram por sua condenação e dois pela absolvição e faltava apenas o voto de Pâmela e era de se esperar que ela, para fazer a vontade de seu marido, votaria por sua condenação. Henrique encarava Na-Hi com uma expressão de surpresa, pois ele acreditava que ela votaria a favor de Cahya e não contra. Entretanto, ele não conseguia sentir raiva da coreana. Estava apenas surpreso e no momento sua pior preocupação é de qual seria o destino de Cahya vivendo sozinha. Em sua mente, já formulava um plano de abandonar a Enseada e ir viver com ela, mesmo sabendo que a separação de Na-Hi e de Milena lhe causaria grande dor. O rapaz foi arrancado de seus pensamentos quando Pâmela começou a falar:
– Uma questão que está sempre presente em meus pensamentos é o motivo de ter sido nós a chegar nessa ilha. Por que nós fomos os escolhidos? Sim, digo escolhido porque eu não acredito que nossa presença aqui tenha sido por obra do destino. A forma como tudo aconteceu, os sonhos de Ernesto que fizeram com que ele acreditasse a viagem em busca desse sonho tinha que acontecer, além do fato de ter sido nós a sobreviver ao naufrágio. Tudo isso me leva a crer que existe uma força invisível que nos trouxe até aqui.
“E por que nós? Volto a perguntar. Eu, por exemplo, nunca fiz nada em minha vida que fizesse de mim uma pessoa especial ou importante. Já contei a minha vida aqui e não preciso repetir de novo como e, se vocês se recordarem do que eu disse, não houve nada que fizesse de mim uma pessoa indicada para fazer parte disso.”
“Se analisarmos direito a vida de cada um de nós, essa dúvida vai permanecer. Vejam vocês o caso do Ernesto. Um homem procurado pela justiça, acusado de ser o responsável pela morte de inúmeras pessoas. Tantas que não dá nem para citar. Entretanto, quem conhece o histórico dele, e eu conheço muito bem, pois ocupei muito tempo da minha vida o investigando, vai chegar à mesma conclusão que eu. Nenhuma das pessoas que foram mortas por ordem de Ernesto poderia ser consideradas inocentes em um julgamento justo. Ele nunca mandou assassinar um inocente e, em muitos casos, a morte da pessoa que ordenada por ele significou a salvação de muitas outras, essas em sua maioria inocentes.”
“Isso quer dizer alguma coisa. Tem que ser. O que eu penso é que ele, embora tenha errado ao assumir o papel do carrasco, sempre teve um senso de justiça apurado e talvez seja esse o motivo de estar aqui. Talvez seja esse o papel que ele tenha que desempenhar. Foi um azar muito grande que, no primeiro julgamento que tivemos, ele tenha sido impedido de atuar em virtude dos laços que tem com a vítima. Porém, tenho certeza que, no futuro, poderemos confiar no seu senso de justiça.”
“Assim como ele, todos nós temos uma função específica nessa ilha. Eu não poderia dizer agora qual é a minha, mas vou me dedicar a descobrir isso. Quanto a vocês, algumas dessas funções já foram definidas, da Margie com seu poder de se comunicar com Chantal, assim como a Diana com o Áquila e a Cahya com a Ruta. Vejam vocês como foi útil essa interação dela com o golfinho que surgiu no momento certo e nos alimentou com peixes quando nossas alternativas se resumiam a frutas. Henrique com seu extenso conhecimento, sempre encontrando as respostas que precisamos e o Nestor com sua força ilimitada. Todos têm uma missão específica.”
“E é justamente a crença deste objetivo, que ainda não sei qual é, que me impede e me leva a votar da forma como vou fazer. Todos nós somos imprescindíveis, existe um objetivo para nossa presença aqui que ainda não nos foi revelado e nenhum de nós pode ficar na metade do caminho. Temos que caminhar juntos sempre. Os nove. Ninguém pode ser abandonado. Então, não podemos expulsar alguém do grupo sem corrermos o risco de todos nós sermos atirados para fora e no final, ninguém chegar ao final dessa missão. Pensando assim, peço desculpas ao meu marido a quem amo demais, mas amo a todos vocês. Eu voto pela absolvição de Cahya.”
O suspiro alto de Henrique foi ouvido por todos e Ernesto olhava para Pâmela de um jeito diferente. Ele não expressava raiva. Era como se ele estivesse vendo sua esposa pela primeira vez na vida e essa visão fez com que ele entendesse que o seu procedimento com relação à Cahya era egoísta e levara em conta apenas a dor e a preocupação por sua filha, sem pensar nos demais. Aquela era a primeira vez que o Ernesto via aquele grupo como uma família. Uma família que, de um jeito ou de outro, dependia também dele. Aliás, aquelas pessoas, inclusive ele, necessitavam uns dos outros e a única coisa que ele podia fazer em relação a isso era lutar com todas as suas forças para mantê-los unidos.
Entretanto, o voto de Pâmela fez com que surgisse um impasse. A votação estava empatada. Diante disso, alguém propôs que o Ernesto votasse, porém, Henrique foi contra, alegando que se o Ernesto votasse, mesmo estando envolvido emocionalmente no processo, a Cahya também teria o mesmo direito. Isso fez com que surgisse uma discussão onde cada um queria defender seu ponto de vista. Todos falavam ao mesmo tempo e suas vozes iam aumentando de volume, até um relincho alto chamou a atenção de todos que se voltaram para olharem o Tornado que havia se aproximado sem que eles notassem. Mas não foi o Tornado que chamou a atenção de todos.
Sentada em sua cama, com o peso do corpo sobre uma de suas mãos que estava espalmada para trás e apoiada no colchão e a outra nos joelhos que estavam levantados e ambas as pernas dobradas, Milena olhava para eles com um sorriso estampado no rosto. Antes que alguém dissesse alguma coisa, ela perguntou:
– Por que vocês estão todos discutindo? O que aconteceu para deixar vocês tão bravos?
Não houve respostas, todos correram em sua direção e começaram a abraçá-la enquanto falavam ao mesmo tempo. O local se transformou em uma bagunça e ninguém se lembrava de mais que estavam em um julgamento. Foi a própria Milena que chamou a atenção para esse fato e se impôs, exigindo que lhe explicassem o que estava acontecendo.
Pâmela foi a encarregada de contar tudo o que havia acontecido, porém, a reação de Milena em relação ao que ela dizia era estranha. Em momento algum a garota revelava estar ofendida ou surpresa com alguma coisa. A narrativa seguiu até chegar ao momento atual, onde o impasse provocado pelo empate na votação fez com que Milena a interrompesse e dissesse:
– Mas isso é fácil de resolver. Eu não votei ainda.
Mais uma vez foi o Henrique que protestou. Ele achava que o voto de Milena, justamente a vítima daquele crime, condenaria Cahya que, segundo ele, já tinha sido salvo pelo voto inesperado de Pâmela a favor de sua absolvição. De nada adiantou, pois, exceto ele, todos os outros eram favoráveis ao direito que a loirinha tinha de votar.
O voto de Milena foi curto e grosso. Ela pediu ajuda para se levantar e, quando em pé, se apoiou no pai, pois ainda estava muito fraca. Então ela falou:
– Esse julgamento não tem o menor sentido. A Cahya já está arrependida do que fez e, se ela está arrependida é porque venceu o ódio que a obrigou a cometer o ato. Essa é a verdadeira absolvição, pois mesmo que ninguém a condenasse, ela teria que carregar o peso desse ódio pelo resto de seus dias. Quanto ao meu voto, não sou eu que devo julgar. Eu acredito que cada um de nós, antes de ser julgado pelos outros, devemos olhar para dentro de si e fazer uma autoanálise dos motivos que a levaram a cometer o erro. Mas, como o meu voto vai pôr fim a um impasse, então eu voto pela absolvição.
Milena, ao dizer isso, tinha os olhos presos aos de Henrique. Era como se ela dissesse a ele que haviam outros erros a serem perdoados. Entretanto, sem conseguir resistir ao apelo daqueles lindos olhos azuis olhando para ele com uma intensidade que fazia com que todos os sentimentos viessem à tona. Ali havia culpa e perdão e ao mesmo tempo, amor. Como se um imã o atraísse, Henrique venceu a distância que o separava dela, tomou Milena nos braços e, diante de toda aquela plateia, beijou sua boca. Um beijo suave que demonstrava o amor que havia entre os dois e ao mesmo tempo intenso a ponto de deixar transparecer o desejo mútuo que sentiam.
Cahya, ao ver seu marido beijando a boca de Milena sem se importar com sua presença, passou a ser o alvo da atenção de todos. Sem perceber isso, ela começou a andar lentamente em direção ao casal. Na-Hi se interpôs em sua caminhada impedindo que ela continuasse. Cahya ficou imóvel com os olhos presos ao da coreana que, ao perceber apenas tranquilidade naquele olhar, ficou indecisa sobre o que fazer. Mas foi a voz de Milena, que já desfizera o beijo com Henrique que acabou com sua indecisão:
– Deixe a Cahya passar, Na-Hi. Você não precisa se preocupar.
Na-Hi então deu um passo para o lado, deixou o caminho livre. Cahya se aproximou de Henrique e Milena e foi acolhida por um abraço de Milena e depois um selinho em sua boa. Quando conseguiu falar, disse com um tom de voz emocionado:
– Eu querer vocês felizes. Saber vocês merecem estar felizes.
– Você também merece, querida.
Ao dizer isso, Milena empurrou Henrique para o lado de Cahya e, ao ver que ele resistia à pressão que fazia em suas costas, falou:
– Vamos lá, Henrique. Beije a Cahya. Eu sei que você quer muito isso.
Henrique, em sua surpresa, ficou imóvel. Foi Cahya que, depois de pedir perdão a ele e concluir dizendo a única frase que conseguia pronunciar corretamente, confessou seu amor:
– Eu amo vocês.
Depois disso, ela se atirou contra o corpo do rapaz, enlaçou seu pescoço com as duas mãos e beijou sua boca. Mas Milena não deixou de perceber que Cahya, ao declarar o seu amor, usou o plural, o que queria dizer que ela não estava se declarando apenas para Henrique. Eufórica com aquela demonstração de amor, Milena, empurrou Henrique e tomou o seu lugar. Dessa vez foi ela que, sendo um pouco menor que Cahya, enlaçou o pescoço da garota e beijou sua boca com ternura. Depois, a loirinha foi até onde Na-Hi estava paralisada com a cena que assistia, pegou sua mão e a levou até o Henrique, praticamente obrigando que os dois se beijassem.
Ernesto olhava aquela cena impassível. Mesmo assim, Pâmela foi até ele e falou com a boca próxima ao seu ouvido:
– Isso não está te deixando com ciúme?
– Lógico que não. Eu já entendi que nesta ilha as relações entre as pessoas não obedecem ao mesmo critério ao qual fomos acostumados.
– Até pode ser. Mas que é estranho é. Veja só. Agora temos uma relação amorosa entre o Henrique, Cahya, Na-Hi e a Milena.
– Pois é. Mas eu acho que não vai parar aí. Eu não ficaria nada assustado se essa relação amorosa fosse se expandindo até que nós todos estejamos envolvidos em um único sentimento. Veja você, por exemplo, que não consegue esconder o seu desejo por Henrique.
Nesse momento, Milena tinha se afastado do grupo. Mesmo ainda estando fraca, ela sabia que tinha alguém ali perto que também ansiava por seus carinhos. Ao vê-la se aproximar, Tornado começou a ficar agitado, dando pequenos saltos com as patas dianteiras. Ela abraçou sua enorme cabeça e repetiu a frase que se tornara o cumprimento obrigatório entre eles:
– Bom garoto. Bom garoto e muito lindo.
Tornado, ao sentir o carinho que Milena fazia em sua cara, dobrou os joelhos das patas dianteiras e depois deixou seu corpo cair no chão, ficando deitado. A garota montou sobre ele e inclinou o corpo para frente envolvendo seu pescoço com os braços. Em seguida o cavalo voltou a ficar em pé e saiu andando lentamente, enquanto Pâmela gritava:
– Não Milena. Você ainda está muito fraca.
– Não se preocupe Pam. O Tornado sabe disso e vai cuidar de mim.
Como se Tornado tivesse o poder de transferir sua força para Milena, antes de se afastarem cem metros, ela já conseguia ficar ereta sobre o lombo do cavalo que começou a apressar seus passos, logo passando a um galope suave. Ao longe, os relinchos de Raio e Ventania que corriam ao seu encontro.
Naquela noite Milena se aproximou de Cahya e Henrique logo que eles foram se deitar. O coração do rapaz acelerou quando ela se deitou ao seu lado e, sem resistir, ele se virou para ela e beijou sua boca. Quando o beijo parou, olharam para Cahya que, sentada ao lado do Henrique, olhava para eles com um sorriso nos lábios. Os três ficaram calados e logo Milena sentiu o toque suave dele em seus seios e depois deslizando pela barriga em direção à sua xoxota. Ela usava agora apenas a saia de couro e um top do mesmo material. Sua calcinha já se perdera há muito tempo e o contato da mão de Henrique com sua pele fez com que se arrepiasse toda. Milena fechou os olhos e suspirou ruidosamente, mas quando a mão chegou até sua coxa, ela a segurou e puxou de volta, beijando cada um de seus dedos. Depois, puxou Cahya que caiu entre os dois, fez com que ela ficasse deitada de costas e puxou Henrique pelo braço fazendo com que o rapaz ficasse sobre a garota. Então falou pela primeira vez:
– Hoje é dia de vocês dois. Mas Henrique. Não é para você foder a Cahya, nem acho que vocês devam transar. Hoje é o dia de fazer amor. Eu quero que vocês se entreguem um ao outro e demonstrem todo o amor que sentem.
– Mas… Mas é Milena que Henrique ama. – Falou Cahya em meio aos gemidos ao sentir o pau dele invadindo sua buceta.
– Você está errada. Não é a mim. Quer dizer, ele me ama sim. Só que não ama apenas a mim. O amor dele é dedicado a todas as mulheres que estão nessa ilha. Ele apenas não sabe disso ainda.
Ao ouvir isso o Henrique se virou para o lado saindo de cima de Cahya que olhou para ele com decepção enquanto ele falava:
– Que loucura é essa? – Isso não é possível.
– Você acha que é loucura? – Disse Milena o encarando. – Pois você está errado. As coisas nessa ilha não acontecem da forma como nós nos acostumamos, Aqui as coisas são diferentes e o amor que você sente por todas nós é correspondido.
Henrique abriu a boca para contestar, mas Milena o interrompeu dizendo:
– Sim. Você está certo em pensar assim. Nós mulheres te amamos, mas assim como você, nosso amor não é direcionado apenas a você. Todas nós sentimos pelos outros a mesma coisa que sentimos por você. Amor, tesão, carinho, cuidado, preocupação. Tudo isso acontece com a gente. Não são todos que já descobriram isso. Acho que a Pâmela, a Diana e a Na-Hi já sabem e a Margie ainda não pensou no assunto porque ela vê as coisas de uma forma diferente. Cahya e eu sabemos por causa de uma experiência que vivemos…
– Aquele sonho não ser sonho? Ser uma visão? – Perguntou Cahya interrompendo a frase de Milena.
– Não sei. Visão, premonição, aviso. Mas o que importa isso. Foi algo importante e aconteceu para colocar algumas coisas que estavam fora do normal nos eixos. E quando eu digo normal, não estou me referindo àquilo que antes entendíamos ser normal. Todo tem que abrir nossas mentes para uma nova realidade.
– De que sonho vocês estão falando? – Perguntou o Henrique.
– Nada não. Quer dizer. Não adianta explicar agora. Na hora certa você vai saber.
– Todos ter que unir para cumprir missão. – Falou Cahya com os olhos fechados.
– Exatamente, Cahya. Amor incondicional, está lembrada? E entre todos.
– Estou ficando pirado com essa conversa. Que porra é essa? – Perguntou Henrique.
– Apenas uma coisa que vamos contar quando estivermos todos juntos. – Falou Milena para o Henrique e depois, dedicando a ele seu melhor sorriso, pediu: – Agora, por favor, faça amor com a Cahya. Mostrem um para o outro o quanto vocês se amam e como é importante permanecerem juntos.
Puxando Henrique para a posição de antes, sobre Cahya, Milena ficou assistindo enquanto ele penetrava lentamente o pau na xoxota dela. Permaneceu ali o tempo todo, assistindo a transa dos dois enquanto fazia carinhos, ora em Henrique, ora em Cahya, intensificando esse carinho na garota quando seus gemidos começaram a ficar mais altos e seu corpo agir como se tivesse vida própria. Cahya rebolava e erguia o quadril para não deixar nenhum milímetro do pau dele fora dela até que os dois gozaram juntos. Seus gritos altos encheram a enseada e depois eles ficaram prostrados sobre a areia.
Milena permaneceu ao lado dos dois ainda se dedicando a lhes fazer carinhos até sentir que eles, vencidos pelo cansaço, cochilaram. Depois se levantou e sentiu suas pernas fracas como se fosse ela a gozar. Quando olhou para o local onde deveriam estar os outros seis integrantes do grupo, notou que não estavam em suas camas. Procurou por eles e os encontrou sob a árvore onde costumavam se reunir. Estavam todos em pé e olhavam para ela, mas o que chamava a atenção foi o fato deles estarem bem próximos uns dos outros. Sorrindo, foi se juntar a eles. Naquela noite, todos tiveram um sono repousante.
A recuperação de Milena fez com que todos no acampamento passassem a agir com maior eficiência e rapidez. Naquele mesmo dia ela fez com que Nestor e Diana providenciassem um cercado para poder apartar os bezerros de suas mães, informando que iria ordenhar as vacas na manhã seguinte, pedindo a ajuda de Cahya para que deixasse a sua disposição algumas das vasilhas de cerâmica que eram usadas na cozinha. Depois examinou as vacas e viu algo que tinha escapado de Henrique. Uma delas tinha duas de suas tetas feridas pelos lobos e seu bezerro estava esquelético, pois não mamava desde então. A dor que o ferimento provocava não permitia que ela alimentasse o filhote. Milena escolheu a vaca que aparentava estar mais saudável, prendeu suas pernas com um pedaço de corda feita de cipó e com outra laçou o bezerro fazendo com que ele mamasse nessa vaca que quis refugar, porém, ela passou o tempo todo diante da mesma, fazendo carinhos em seu pescoço e falando algo em volume tão baixo que somente a vaca podia ouvir. No futuro, ela repetiu essas ações até que a vaca passasse a permitir que o guacho (bezerro que cresce sem a mãe) mamasse nela todos os dias.
Naquela noite, quando se reuniu com Na-Hi, informou a ela que a vaca ferida tinha que ser sacrificada e que sua carne poderia ser usada na alimentação de todos. Houve protestos por parte de Margie e Diana, porém, Milena foi convincente ao ponto que elas aceitaram o fato que eles não tinham como curar os ferimentos da vaca e que o sofrimento dela era pior do que a morte. Depois, antes de dormir, desenhou o projeto de um mangueiro na areia e depois pediu para o Henrique, que cresceu em uma região onde o forte da economia era a pecuária, para explicar como esse mangueiro podia ser construído. Só depois de ouvir toda a explicação de Henrique é que ela resolveu dormir. Porém, ao ir se deitar, ela não se dirigiu à cama onde estavam Ernesto e Pâmela. Em vez disso, ela segurou a mão de Henrique e o levou até onde Cahya já estava deitada.
Naquela noite, mais uma vez Milena não transou com Henrique ou com Cahya. Ela se limitou a ficar ao lado deles apenas assistindo a transa dos dois enquanto os incentivava com palavras ditas em sussurros, Uma vez ou outra ela fazia carinhos nos amantes.
O dia seguinte foi de trabalho para todos. A vaca foi abatida e, sem saber de onde vinha tanto conhecimento e habilidade, Cahya comandava as ações. Ela orientou como esfolar a vaca sem estragar o couro que Diana, sob orientação de Na-Hi, esticou em três varas compridas e a colocou sobre o morro do lado norte. O trabalho de vigiar o couro para que não fosse danificado por aves de rapina coube ao Áquila. Mas a tarefa que deu mais trabalho foi fazer com que os filhotes bebessem o leite depositado em uma vasilha. Eles estavam acostumados a mamar e não havia nada que pudesse servir como mamadeira. Quando Na-Hi se mostrou desanimada pela falta de resultados dizendo que precisavam pensar em alguma coisa, Margie interviu dizendo:
– Não precisa não. Todos eles já bebem água no lago, então vão aprender a tomar o leite da mesma forma.
Dois dias depois isso deixou de ser problema, pois as tetas de Chantal secaram de vez, assim como as de Margie. Entre morrer de fome e tomar o leite, mesmo que fosse lambendo, os filhotes ficaram com a segunda opção.
Metade do mangueiro ficou pronto. O local escolhido ficava a meio caminho entre a Enseada e o pasto onde eles permaneciam o dia inteiro. Para que o sal pudesse ser consumido por eles, Nestor e Henrique cavaram algumas valas que Na-Hi forrou com o mesmo barro usado na construção de vasilhames, improvisando assim três cochos esparramados em meio ao pasto. Faltava agora recuperar as cabeças de gado que tinham se extraviado.
Parecia até que a recuperação de Milena tornava tudo mais fácil. No quarto dia, através da visão de Áquila, Diana avistou algumas cabeças. Não estavam muito longe e só não foram encontradas antes porque encontraram um bosque que, mesmo coberto de árvores, tinha o chão forrado de um capim verde e apetitoso, fazendo com que elas ficassem sempre sob as árvores e ocultas do olhar apurado de Áquila. Como o local era próximo, Milena, Diana e Nestor saíram de manhã e voltaram antes do anoitecer conduzindo a boiada. Infelizmente, duas das vacas solteiras tinham se separado do rebanho e não foram encontradas. Entre as prenhas, duas estavam com a barriga tão grande que suas crias nasceriam em questão de dias.
Um ato fortuito fez com que Na-Hi acrescentasse algo novo para ser usado na defesa deles. Aconteceu por acaso quando estavam construindo o curral. Ao esticar uma corda, Nestor exagerou na força e Henrique, que segurava um pedaço de pau, golpeou o cipó que vibrou emitindo um som que chamou a atenção dos três e depois disse em tom de brincadeira:
– Essa corda é mesmo resistente. Acho que dá até para fazer um instrumento musical com ela.
Continuaram a trabalhar, mas logo os dois rapazes notaram que Na-Hi estava muito pensativa, olhando para a corda com aquele olhar que tinha sempre que estava planejando construir alguma coisa, o que fez com que Nestor brincasse com o Henrique dizendo:
– Olha só o que você fez. Agora a Na-Hi vai dar um jeito de construir um instrumento. Melhor dizendo. Um não, mas nove. Depois ela vai formar uma orquestra e para isso vai nos obrigar a ensaiar pelo resto de nossas vidas.
Eles estavam errados. Na-Hi estava sim imaginando construir algo. Mas era alguma coisa que não tinha nada a ver com música. Quando ela finalmente saiu de seu transe, falou sem se dirigir a ninguém em especial:
– Como não pensei nisso antes. Se tivesse pensado, a luta contra os lobos teria sido muito mais fácil.
– Do que você está falando, Na-Hi. Por acaso você acha que, se tivesse um instrumento para tocar, os lobos fugiriam? Temos que ser péssimos músicos para conseguir isso.
– Não é isso seu idiota. Vem comigo. Os dois.
Por causa disso, os dois passaram o resto do dia a cortar os galhos que Na-Hi mostrava para eles. O tipo de galhos escolhidos por ela logo fez com que Henrique entendesse o que se passava na cabeça da engenhosa coreana e ele falou:
– Puta que pariu. Você está certa. Isso nos teria dado uma vantagem e tanto.
– Posso saber do que você está falando, Henrique?
– São arcos, Nestor. Na-Hi está pensando em fazer arcos e flechas. Com eles, podemos atingir os animais antes que eles se aproximem muito da gente.
A ideia de Na-Hi quase deu certo. Faltava alguma coisa para manter as flechas se movimentando em linha reta e ela sabia o que precisava e, como se estivesse pensando em voz alta, falou:
– Penas. Nós precisamos de penas. – Disse Na-Hi olhando para Diana que naquele momento passava por perto.
– Não olhem para mim. Eu que não vou depenar o pobre do Áquila. – Falou Diana sorrindo.
Na-Hi, depois de rir da Diana, explicou:
– Não se trata disso. Mesmo porque, nós precisamos que o Áquila mantenha suas penas para voar. Estava pensando em encontrar outro tipo de ave. Araras, talvez;
– Eu sei. Entendi. O que você quer dizer com encontrar outras aves é “o Áquila recomeçar a caçar”. Dê um descanso para o pobre, Na-Hi.
– Não precisa pressa. Quando ele estiver descansado, me avise para combinarmos como vamos fazer isso.
Outro acontecimento que causou alvoroço no acampamento foi promovido por Cahya. Em uma bela manhã, ela convocou Milena e Margie para irem com ela até o mangue, entregando a cada uma um pedaço de corda e as lembrou de que deviam levar suas facas. Depois disso, elas desapareceram em meio à mata indo em direção ao sul e não foram mais vistas durante quase todo o dia.
O aparecimento delas, quando o sol já se punha é que chamou a atenção de todos. Foi a Pâmela que as viu, porém, não as reconheceu e gritou assustada:
– Olhem aquilo. Olhem bem para aquilo. Nós não estamos sozinhos nessa ilha. Existem outros aqui e devem ser nativos.
Todos olharam para a direção que ela apontava e viram três vultos caminhando despreocupadamente pela praia. O susto fez com que prendessem a respiração e Nestor e Ernesto empunharam suas facas. O clima ficou ainda mais estranho quando Henrique, apesar da tensão reinante, começou a gargalhar. Todos o encararam como se ele estivesse louco e ele, tentando se controlar, falou em meio ao seu riso:
– Gente, presta atenção. Mesmo que houvesse nativos nessa ilha, não ia existir nenhum nanico. Olha para o que está à direita. Não mede nem um metro e meio.
– E daí? – Perguntou Pâmela – Pode se tratar de uma criança.
– Até poderia. Agora, prestem atenção no jeito de andar. A que está à esquerda também está rebolando muito para alguém que sempre viveu aqui.
– O que você está querendo dizer, Henrique?
– Aqueles três são tudo, menos nativos. Nem são aqueles, são aquelas. Agora que eu vejo que cada uma carrega uma fieira de caranguejo, não tenho mais dúvidas. Cahya e suas duas seguidoras malucas estão regressando e, se preparem, vamos ter sopa de caranguejo no almoço de amanhã.
Realmente o Henrique estava certo. As três garotas, com seus corpos completamente cobertos de uma lama preta, onde apenas os olhos estavam aparecendo, caminhavam tranquilas em direção a eles. O dia inteiro no mangue rendeu muitos caranguejos, mas a um custo alto. As três tiveram que ficar de molho no lago durante grande parte da noite para se livrarem do barro que já secara em suas peles.
Quinze dias depois os arcos estavam prontos e Na-Hi padeceu horrores para treinar ‘seus soldados’ a dispararem com eles. Não que a maioria não tenha conseguido melhorar seus disparos com o treinamento. Difícil mesmo foi adaptar um arco para a Margie que ela conseguisse puxar a corda, pois os primeiros que ela utilizou, não conseguia dobrar o arco e as flechas disparadas por ela caiam a menos de cinco metros de distância. Outra dificuldade foi fazer Milena ficar com os olhos abertos na hora do disparo, pois ela sempre fechava os olhos quando ia soltar a corda do arco.
Para carregarem as flechas, Na-Hi resolveu usar a borracha do último bote salva vidas que ainda flutuava, mas foi impedido por Henrique que disse a ela que aquele barco ainda poderia ser útil. Ela, pensando que ele estava planejando sair da ilha com ele, contestou veementemente argumentando que eles só sairiam daquela ilha se acontecesse um milagre, pois sequer sabiam onde estavam. Quem resolveu o problema foi a Pâmela que, usando tiras de taquara e o cipó, construiu nove aljavas. Uma para cada.
E a busca por penas para serem usadas nas flechas rendeu mais um tipo de alimento para os nove. Uma dúzia de galinhas e um galo foram encontrados e levados para a Enseada, No início, foi um alvoroço e Margie passou três dias e três noites sem dormir até que conseguisse fazer os filhotes de Chantal entenderem que aqueles animais não eram para servir de alimentos a eles que nem tinham aprendido a caçar. O pior foi o Neve que não via as galinhas como fonte de alimentos, mas uma grande diversão. Foi preciso que Margie o mantivesse ao seu lado o tempo todo, provocando nele um enorme mau humor.