Anoiteceu na cidade de Betim, Minas Gerais. Tristeza para alguns, porém para outros, não.
O assassinato de Leonardo Farias não era apenas mais um crime, e sim um mistério. Após horas de trabalho, a perícia encerrou suas investigações no local do crime. O celular e a chave da residência haviam sumido. O corpo, já sem vida, foi cuidadosamente ensacado e levado para o Instituto Médico Legal.
No IML, a dor e o silêncio eram dominantes. Eleonora e Hugo estavam lado a lado, unidos pela tristeza da perda de um filho.
Eleonora, que sempre manteve uma postura inabalável, agora estava devastada, os olhos inchados, as mãos trêmulas. Hugo, por mais forte e frio que fosse da vida e nos negócios, não conseguiu conter as lágrimas ao assinar os documentos necessários para a liberação do corpo. A decisão foi rápida: Leonardo voltaria ao Rio de Janeiro, sua cidade natal, para ser enterrado.
O trajeto até o aeroporto de Belo Horizonte foi uma procissão amarga, interrompida pelo choro de Eleonora. A dor da perda do seu único filho era insuportável, mas a revolta, de não saber quem havia feito aquilo, corroía ainda mais.
Enquanto isso, na cena do crime, a polícia esbarrava em diversos obstáculos. O local do motel era em uma região distante do centro urbano, um lugar de muitas árvores e vegetação. A falta de documentação exigida pelo motel dificultava a identificação de possíveis suspeitos, as câmeras de segurança não funcionavam e pouco ajudaram nas investigações. O motel, antes um antro de perdição e de encontros clandestinos, agora estava interditado.
A dona, desesperada, gritava aos repórteres, jurando que não tinha envolvimento e culpando a polícia pela interdição. Mas ninguém se importava. A única coisa que importava era quem havia esfaqueado Leonardo Farias, dezessete vezes até a morte.
Em diferentes pontos da cidade, a reação ao crime variava. Lavínia e Atílio se abraçaram quando acordaram. Para Lavínia, a perda da chance de engravidar do amante era horrível. Para Atílio, aquilo significava o fim de uma ameaça, um alívio.
Solange, aliviada, abraçou o marido. Ela estava nas mãos de Leonardo, agora livre das ameaças do rapaz.
Felipe e Miguel trocaram mensagens, comentando o ocorrido. Eles falavam dos momentos legais que viveram com o amigo descolado.
Na casa de Alessandra: Caroline, nervosa, suas mãos estavam frias, ela sentou-se no sofá. Seus olhos estavam lacrimejados e arregalados de pavor. A jovem chamou a mãe para uma conversa séria.
— “Mãe… segui totalmente o seu plano” — Ela fez uma pausa e segurou nas mãos de Alessandra. — “Eu não matei o Leonardo” — a voz da jovem saiu embargada, quase um choro, em sussurro.
Alessandra arregalou os olhos e puxou as mãos, as colocando na boca. Sua expressão era de espanto e preocupação.
— “Como assim, Caroline? O que aconteceu lá? Quem o matou?”
Caroline respirou fundo, buscando o ar, tentando controlar o nervosismo e o tremor da própria voz.
— “Ele havia acabado de gozar no cu.” — Caroline fez uma pausa, desviando o olhar. — Eu estava com a peruca, para não deixar os fios de cabelos caírem.” — Ela fez outra pausa. — “Ele até estranhou de eu estar usando peruca, mas você sabe como ele era tarado. Caroline continuou: — “Já tinha colocado o remédio que você me deu na taça do espumante dele. E ele bebeu tudo. Daí entrei naquele banheiro imundo pra tomar banho, pra tirar o esperma do cu e esperar o efeito do remédio surtir…, mas de repente, mãe… alguém arrombou a merda daquela porta!”
Alessandra franziu a testa, sentindo um calafrio percorrer sua espinha. — “Como assim, arrombou?!” “Me fale, garota”
Caroline começou a chorar, a imagem do horror ainda fresca na mente: — “É, foi isso que aconteceu. Eu só ouvi o Leonardo dizer: “Quem é você? … “Quem é você? Sai daqui” e depois… depois aquele som de socos…” — Mãe e filha, ela se abraçou mais forte, fechando os olhos. — “E em seguida, o som da lâmina perfurando-o, várias vezes. Um barulho horrível, terrível. Leonardo deu dois gritos, pedindo ajuda.” — A jovem deitou no colo da mãe e chorou.
Alessandra levou a mão à boca, sentindo seu estômago revirar.
— “Meu Deus… Meu Deus… filha. — Fazendo carinho na cabeça da sua filha.
Caroline continuou: — “Fechei a porta, mãe, e me encolhi no canto. A pessoa tentou abrir o banheiro, mãe!” — Caroline arregalou os olhos, segurando as mãos da mãe com força. — Eu pensei que fosse falecer ali! Mas a pessoa se assustou com algum barulho, deu um chute na porta e foi embora.
— “Você viu quem era? Alguma coisa?” — Alessandra apertou os ombros da filha.
Caroline negou com a cabeça, as lágrimas escorrendo pelo rosto.
— “Não, só um barulho de moto distante… não consegui ver nada! Quando saí do banheiro…” — ela soluçou — “Leonardo ainda tava vivo, mãe! Ele ainda tava agonizando na cama, cheio de sangue… os olhos vidrados.”
Alessandra sentiu um arrepio na espinha.
— “E o que você fez?”
— “Mesmo desesperada, mãe. Peguei o picador de gelo e dei dois golpes no peito daquele desgraçado.” — Caroline disse, em um tom frio na voz, passou as mãos no rosto, limpando as lágrimas que insistiam em cair. — “Fechei a porta, vesti a roupa de qualquer jeito, calcei minhas sandálias, peguei minha bolsa e fugi pelos fundos, pelo matagal! — Andei trinta minutos pela trilha sozinha, joguei a peruca e o remédio na mata e continuei andando até conseguir um táxi e voltar para casa. Quando cheguei, tomei banho, me aprontei toda, peguei outro táxi e fui encontrar Hugo no Hotel.
Alessandra segurou os ombros da filha, tentando manter a calma, franzindo o cenho. — “Alguém te viu saindo?”
— “Não…” — Caroline fungou, a voz trêmula. — “A gorda, a dona do motel não tava na recepção. Não tinha ninguém, mãe! Aquele horário, o movimento é lento.”
— “E se as câmeras pegaram você?!” — Alessandra sussurrou, o pânico começando a se infiltrar em seu tom de voz.
— “Eu pensei nisso…, mas eu acho que as câmeras não funcionam, e outra, eu pedi o capacete do Leonardo! Meu rosto não apareceu!” — Caroline segurou firme as mãos da mãe. — “Ele era o único que sabia que eu tava lá… e agora o vagabundo tá morto!”
Alessandra bufou, se jogando no sofá, passando a mão no bico do seio direito, com o olhar vago. — “Mas afinal… quem matou ele?”
Caroline franziu as sobrancelhas, seus olhos cheios de medo.
— “Eu não sei, mãe…” — sua voz saiu num fio. — “Só sei que tive sorte… porque eu podia ter sido a próxima.”
Alessandra, friamente, puxou sua saia para cima, baixou a calcinha, abriu as pernas, olhou para a filha e disse: “Filha, faz um carinho na mamãe?” Caroline sorriu, mordeu o cantinho esquerdo do lábio inferior, sentindo o coração disparar no peito. A jovem obedeceu, meteu a boca na vagina da mãe e elas ficaram ali, no sofá, transando, comemorando a morte de Leonardo com incesto.
No dia seguinte, os jornais ainda estampavam a manchete. Programas de rádio discutiam as possíveis motivações do crime. Na internet, teorias conspiratórias surgiam a cada minuto.
No Colégio Horizonte do Saber, a direção soltou uma nota: as aulas no colégio estavam suspensas por dois dias.
No Rio de Janeiro, sob um céu nublado, Leonardo foi sepultado. Poucos estavam lá, além da família, e alguns aliados políticos de Hugo e Eleonora. O caixão desceu lentamente à cova, e Eleonora desabou.
— “Meu filho…” “Meu filho…” “Meu filho…” — repetia, os soluços, impedindo que ela dissesse mais.
Os olhos lacrimejados de Hugo se fecharam, segurando a raiva e o luto. O empresário não vai sossegar enquanto não souber o responsável pela morte do filho.
O crime permanecia sem solução. A polícia está investigando, a única certeza era de que Leonardo Farias estava morto. E, para muitos, isso era mais um alívio do que uma tragédia.
No hospital, ainda deitado na cama. Nicolle foi visitar Fernando. Ela deu um abraço nele e disse:
— Bom dia, meu irmão. Como você está?
— Estou bem, Nicolle, amanhã terei alta do hospital. — respondeu Fernando, deitado na maca, em um tom de voz rouca.
— “Fernando… Eu já tinha um plano pra acabar com ele, meu irmão” — sussurrou Nicolle, enquanto olhava nos olhos do irmão. — “Se um dia, eu cruzar com quem fez isso, dou um abraço nele de gratidão.”
Fernando, ao lado, sorriu, virou o rosto, falou para si:
“Obrigado pelo abraço, maninha.”
Foi Fernando, o mandante do assassinato de Leonardo Farias:
A reputação do ex-professor de educação física do Colégio Horizonte do Saber estava manchada na cidade. Fernando, consumido pelo ódio e vingança, não deixou o destino agir por conta própria. Dias antes da tragédia, ele e seu fiel amigo Tom (citado no 11° capítulo). Viajaram até a cidade de Urucaia, 50 km de Betim.
O encontro foi secreto, em um terreno abandonado na periferia daquela cidade. Sob a luz fraca de um poste quebrado, eles se encontraram com Beto Chacal, um homem de olhar frio e cicatrizes no rosto, cuja reputação era suficiente para fazer qualquer um pensar duas vezes antes de cruzar seu caminho.
— “Quero o serviço feito sem rastros” — disse Fernando, olhando para o assassino.
Beto Chacal olhou para os dois e disse: — “Esse tipo de trabalho tem um preço, amigos. Trouxeram os vinte mil?
Quem entregou o envelope ao assassino foi Tom, o dinheiro trocou de mãos rapidamente. Tom emprestou o dinheiro para Fernando, ele levou a quantia em espécie para evitar problemas para o amigo.
Beto pegou o dinheiro e aceitou o serviço, pegou todas as informações de Leonardo e desapareceu na escuridão do lugar.
Na manhã do assassinato, Beto Chacal já estava seguindo Leonardo, desde o momento que ele saiu para o colégio. De uma moto com a placa adulterada, o assassino observou cada movimento do Leonardo. Quando Caroline surgiu, os dois seguiram juntos para o motel. Beto os seguiu.
O encontro dos jovens havia lhe dado a oportunidade perfeita. Quando pulou o muro dos fundos do estabelecimento, ele se manteve escondido, ouvindo os ruídos abafados de Leonardo e Caroline transando. Leonardo gozou no ânus da jovem, ele levantou-se e foi para o banheiro.
Aproveitando a chance, ela colocou o remédio na bebida dele. Assim que saiu do banheiro. Leonardo tomou o espumante batizado e Caroline foi tomar banho, trancando a porta.
Indiretamente, Caroline ajudou o assassino. O efeito do remédio começou a dominar Leonardo, deixando-o mais lento.
Foi nesse momento que Beto arrombou a porta do quarto. Caroline, assustada, se encolheu no banheiro, colocou as mãos na boca, prendendo a respiração. Leonardo, nu e vulnerável, tentou reagir, acertando um soco no invasor. Mas Beto era experiente e estava sóbrio. Esquivou-se e revidou, dando dois golpes de lâmina que perfuraram o peito, atingindo o coração do rapaz, que caiu na cama agonizando. O assassino continuou golpeando-o repetidamente, até ficar satisfeito, e o sangue de Leonardo escorreu pelos lençóis.
Ele tentou arrombar a porta do banheiro, onde estava Caroline, mas.
ouviu um barulho do lado de fora. Alguém estava chegando no quarto ao lado. Ele esperou o casal fechar a porta. Com pressa, pegou o celular e a chave da casa do Leonardo.
Ao passar pela porta do banheiro, tentou forçá-la outra vez, mas desistiu ao ouvir mais ruídos do lado de fora. Beto guardou a faca, deixou o quarto, correu e pulou o muro dos fundos, subiu na moto e desapareceu pela estrada. Para fugir de qualquer flagrante, o assassino jogou a faca na Lagoa Várzea das Flores antes de partir.
Ele entregou os pertences de Leonardo a Tom, e partiu para sua cidade Natal. Tom, sem perder tempo, usou suas habilidades em TI para desbloqueou o celular do Leonardo.
O que Tom, encontrou ali foi mais do que apenas mensagens ou fotos comprometedoras. Leonardo, havia enviado vírus no dispositivo de dezenas e dezenas de pessoas. A maioria de alunas e professoras, do período da manhã e da tarde. Até no dispositivo da diretora do colégio.
Tom também descobriu: Leonardo havia sido o responsável pelo vírus que destruiu reputação e carreira do amigo. Ele ficou chocado, percebeu que aquele crime não havia sido apenas uma execução, mas uma arma para chantagear dezenas de pessoas.
Enquanto isso, a cidade estava em choque. O corpo de Leonardo, havia sido sepultado no Rio de Janeiro. A polícia vasculhava cada pista, mas a cidade era precária em câmeras. Os rastros de Beto Chacal e Caroline era inexistente.
Caroline, voltou para a escola, como se nada tivesse acontecido.
Lavínia, Solange e Alessandra, estavam aliviadas, enquanto Fernando, se recuperava no hospital, sabendo que o verdadeiro responsável pela morte de Leonardo, era ele mesmo.
O crime, perfeito em sua execução, permaneceu sem culpados. Mas segredos como esse nunca ficam enterrados para sempre.
— Nicolle, fui eu, o responsável por matar o Leonardo. — disse Fernando, cochichando no ouvido da sua irmã.
Nicolle arregalou os olhos, incrédula. Fernando conto todos os detalhes, mas não sabia, quem era a moça que estava na garupa de Leonardo. Caroline estava disfarçada, usava óculos e uma peruca.
Passadas duas semanas, a morte de Leonardo ainda permanecia um mistério. Hugo, impaciente e furioso, usava toda a sua influência para pressionar o delegado Vicente por telefone.
A cada dia, sua exigência se tornava mais agressiva. Ele queria respostas, queria um culpado, queria vingança. Mas Vicente, encurralado, pouco podia fazer, pois a investigação estava estagnada, sem provas concretas, apenas suposições e pistas fracas.
Eleonora, de volta a Betim após duas semanas no Rio de Janeiro, se recuperando da morte e enterro do filho, não perdeu tempo.
Como uma leoa ferida, agiu com frieza e estratégia. Procurou a Polícia Federal, querendo que a investigação fosse tirada das mãos de Vicente e conduzida por peritos mais capacitados.
Mas, enquanto isso não acontecia, Eleonora decidiu agir por conta própria. Reuniu um pequeno grupo de investigadores particulares e, com eles, montou uma ofensiva clandestina para descobrir a verdade. Foi assim que, Alessandra, Lavínia e Caroline foram convocadas para uma reunião na casa da promotora.
O convite não lhes deu espaço para recusa. Os seguranças de Hugo, agora trabalhando para Eleonora buscou cada uma em sua residência, sem explicação, sem aviso prévio, foram forçadas.
Quando chegaram, perceberam que não era apenas um encontro comum. A casa estava silenciosa, e apenas uma lâmpada amarelada iluminava a sala espaçosa. Sentadas, lado a lado, no sofá de couro, Lavínia, Alessandra e Caroline, as três mulheres trocaram olhares.
Eleonora surgiu do seu escritório escuro, elegante como sempre, mas com um olhar que transbordava frieza e ódio. Diretamente, ela anunciou o motivo da reunião:
— “Eu quero a verdade. Quero saber quem tirou a vida do meu filho. E não vou descansar até descobrir.” — Sua voz, cortante como navalha, fez Caroline estremecer.
Antes que pudessem reagir, dez homens em ternos pretos entraram na sala, e um uma maleta prateada. Era um perito forense contratado clandestinamente por Eleonora. Ele estendeu a mão e, em um tom seco, ordenou: — “Celulares. Agora.”
Alessandra cruzou os braços, desconfiada. — “Você não pode simplesmente invadir nossa privacidade dessa forma, Eleonora.”
Alessandra já tomou um tabefe na cara: — “Posso e vou.” — A promotora se inclinou sobre a mesa de vidro, após agredir Alessandra. — “Se alguma de vocês tem algo a esconder, esse é o momento de confessar. Não quero descobrir por outras vias.”
Caroline, de mãos trêmulas, foi a primeira a ceder. Tirou o celular do bolso e o entregou ao perito. Lavínia entregou alguns segundos após. Já Alessandra, ainda relutante, cerrou os dentes antes de entregar o aparelho. — “Espero que saiba o que está fazendo, Eleonora.” — Sua voz soou como um aviso.
— “Sei exatamente o que estou fazendo, sua vagabunda.” — Eleonora respondeu friamente.
O perito abriu a maleta, conectando os dispositivos a um laptop com programas especializados. A análise começou ali mesmo, na frente delas. Arquivos antigos, mensagens, registros de chamadas, tudo foi vasculhado sem filtros.
Alessandra e Caroline, prevendo essa possibilidade, já haviam destruído outros dispositivos onde mantinham informações comprometedoras. Mesmo assim, ficaram amedrontadas.
O silêncio era interrompido apenas pelo som dos cliques rápidos no teclado do supercomputador do perito. Eleonora observava cada reação com olhos de predadora. Lavínia, de cabeça baixa, mordia os lábios. Caroline suava frio. Alessandra com a postura submissa, mas seus dedos inquietos denunciavam seu nervosismo.
Após algumas horas que pareceram uma eternidade, o perito ergueu o olhar. — Nada suspeito aqui por enquanto, dona Eleonora. Mas levarei os celulares para uma análise mais profunda.
Eleonora assentiu, satisfeita. Virou-se para as três e, com um sorriso gélido, disse: — “Devolverei esses lixos para vocês amanhã. Por enquanto, vocês podem ir. Mas saibam disso: se uma de vocês mentiu para mim, eu vou descobrir. E acreditem, a ira de uma mãe é a última coisa que gostariam de enfrentar.”
Uma a uma, saíram, caladas e amedrontadas. Naquela noite, todas pensaram em registrar e denunciar Eleonora, por medo, desistiram de sofrer represarias. Sabendo que a influente promotora e o riquíssimo empresário Hugo não mediariam esforços para foder com a vida de cada uma delas, custasse o que custasse.
Os aparelhos foram entregues, uma a uma, no dia seguinte.
O corredor do hospital estava quase silencioso, cortado pelo bip insistente dos monitores cardíacos e pelos passos de pacientes em recuperação, visitantes, médicos e enfermeiros.
Isso mudou até a chegada da Eleonora. Seus saltos riscavam o piso do hospital, acompanhados pelo som mais grave das pisadas do delegado Vicente e dos dois agentes da polícia local.
Quando chegaram à porta do quarto de Fernando, um dos agentes girou a maçaneta, abrindo espaço para o temporal que estava prestes a se formar naquele lugar. Fernando, ainda debilitado pelos ferimentos, ergueu os olhos com dificuldade ao ver Eleonora entrar.
Sua expressão cansada foi rapidamente substituída pelo medo ao notar o brilho feroz nos olhos dela.
— “Senhor Fernando, creio que já saiba por que estamos aqui” — começou o delegado Vicente, fechando a porta atrás de si. — “Sua participação na morte de Leonardo Farias está sendo investigada, e quanto mais o senhor colaborar, melhor para você.”
Fernando engoliu seco. Sua respiração acelerou e ele tentou se erguer na cama, mas um dos agentes o empurrou de volta com firmeza, mantendo-o no lugar. Eleonora se inclinou sobre ele, os olhos cheios de fúria contida.
— “Meu filho está morto. Alguém o matou brutalmente, e eu juro por tudo que é mais sagrado que eu vou descobrir quem foi” — disse ela, olhando furiosamente para Fernando, sua voz baixa, porém, com ameaças. — “E você está no topo da minha lista de suspeitos.”
Fernando tentou manter a postura, a sua voz saiu trêmula:
— “Eu… eu não sei do que você está falando. Eu não matei o Leonardo.”
Eleonora riu, mas não havia humor naquele som. Era um riso seco, amargo. — “Então por que seu nome aparece entre os possíveis envolvidos?” — perguntou ela. — “Por que você seguia o Leonardo, por que vocês tiveram aquele desentendimento, por que ele sofreu um acidente provocado por você antes de ser assassinado?”
O ex-professor desviou o olhar, suas mãos suando frio.
— Foi um acidente… Eu só queria assustá-lo. Ele arruinou minha vida… — gaguejou.
— “Então você admite ter motivo para querer a morte dele?” — retrucou Vicente, cruzando os braços. — “Porque a impressão que me dá é que você não queria só o assustar. Você queria que ele pagasse pelo que fez com você.”
Fernando ficou em silêncio, respirando pesadamente. Ele sabia que qualquer palavra errada poderia afundá-lo ainda mais. Eleonora deu um passo para trás e fez um sinal para um dos agentes, que tomou o dispositivo eletrônico do bolso do ex-professor e o ergueu à altura dos olhos de Fernando.
— Vou pegar, provisoriamente, o seu telefone. — Exclamou o agente.
Fernando arregalou os olhos. Era o celular que ele usava no dia a dia. Ele sabia que não havia provas ali, pois o contato com o assassino fora feito pelo dispositivo de Tom, que já estava destruído. Ainda assim, seu coração acelerou.
— “Esse aparelho será periciado agora mesmo” — informou Vicente. — “Qualquer vestígio de envolvimento com o crime será encontrado, acredite. E então, Fernando? Vai colaborar ou vamos fazer isso do jeito difícil?”
O suor escorria pela testa de Fernando. Eleonora deu mais um passo à frente, abaixando-se até ficar na altura do rosto dele. Seus olhos, seu ódio, só faltaram entrar na carne do ex-professor.
— “Se eu descobrir que você tem qualquer ligação com a morte do meu filho…” — sua voz se tornou um sussurro venenoso — “Juro que você vai preferir nunca ter nascido. Acredite, te darei de comer aos tubarões em alto mar.”
Fernando suou frio, desviou o olhar, o peito subindo e descendo rapidamente, o silêncio que se seguiu era mais venenoso do que a câmara de gás em Auschwitz. O ex-professor sabia que qualquer suspeita que o relacionasse com a morte de Leonardo, a corda ao redor de seu pescoço iria apertar mais, nem Beto Chacal, o assassino, poderia lhe ajudar.
Quando Eleonora, o delegado Vicente e os agentes deixaram o hospital, Fernando estava lívido, as mãos tremiam sobre o lençol do hospital. Ele tentava processar a situação. O suor escorria pela testa, e a respiração acelerada denunciava o pânico.
Quando Tom chegou ao hospital, Fernando olhou para o amigo como se ele fosse sua última esperança. Seus olhos arregalados e vermelhos entregavam o medo e o desespero.
— “Estamos ferrados!” — Ele murmurou, passando a mão pelo rosto.
— “O que aconteceu?” — Tom puxou uma cadeira e sentou-se ao lado da cama, a testa franzida de preocupação.
Fernando respirou fundo e se inclinou para frente. — “Eleonora está atrás de qualquer um que possa estar envolvido. Ela colocou a Polícia Federal na jogada! Ela mesma veio aqui, com o Delegado Vicente e mais uns agentes. Revistaram tudo, pegaram meu celular… e não encontraram nada, porque… porquê…
Tom sentiu a espinha gelar. Seu coração martelava no peito. — Eu sei… Eu sei… não precisa completar.
— Você destruiu o telefone, certo? — Perguntou Fernando, a voz rouca, em tom baixo.
— “Claro que sim! Assim que a notícia da morte do Leonardo explodiu, eu me livrei dele. Não tem como rastrearem mais nada!” — Tom tentava manter a calma a do amigo.
Fernando jogou a cabeça contra o travesseiro, fechando os olhos. — “Eles sabem que eu tinha motivos. Sabem que eu odiava aquele desgraçado. Agora estou na lista dos suspeitos.”
— “Eles não vão encontrar nada!” — Tom rebateu. — “Encontrei muitas coisas no celular do Leonardo. Vou dar um jeito naquela promotora vagabunda.”
O silêncio tomou conta de Fernando. Ele conhecia Tom desde muito jovem e sabia da capacidade dele. Mais tarde, o médico deu alta a Fernando. Tom o ajudou a trazê-lo para casa.
Na manhã seguinte, em Betim. Uma nova “manchete-bomba” sacudiu o país. A notícia explodiu como dinamite nas telas de TV, nos rádios e nos sites de notícia:
“Promotora Eleonora Farias envolvida em escândalo de corrupção! Vendas de sentenças, lavagem de dinheiro e suborno são expostos por provas irrefutáveis.”
Em poucos minutos, a porta da casa da promotora estava cercada por uma multidão de jornalistas. Microfones erguidos, câmeras piscando, repórteres berrando perguntas sem resposta. O burburinho crescia, populares cantavam: “Corrupta… Corrupta… Corrupta…”
Na residência, Eleonora assistia à própria queda pela TV. O rosto pálido, os olhos fixos na tela, os dedos trêmulos segurando um copo de uísque que já não descia mais. Ela não entendia, como aquilo vazou. O telefone tocava insistentemente, advogados, contatos influentes, aliados desesperados. Ela sabia que se encontrava em uma enrascada, e o cerco havia se fechado.
Viaturas da PF chegaram em frente à mansão. Agentes saíram em passos largos, ignorando os flashes e os microfones. Um deles bateu na porta com força.
— “Promotora Eleonora Farias!” — a voz grave de um dos agentes ecoou pela casa. — “A senhora está sendo detida para averiguações.”
A porta se abriu lentamente. Eleonora surgiu vestida impecavelmente, e de óculos escuros, mantendo a compostura de superioridade, mas sua expressão traía o desespero que fervia por dentro.
— “Isso é um absurdo!” — Ela esbravejou. — “Quero falar com meu advogado imediatamente!”
— “Terá esse direito na delegacia — o agente respondeu friamente, conduzindo-a pelos braços.”
Os flashes explodiram como fogos de artifício. Gritos, perguntas, empurrões da imprensa. Eleonora foi colocada no banco traseiro da viatura, sua imagem gravada de todos os ângulos possíveis. Seu nome, antes sinônimo de poder, agora se tornava manchete de escândalo. O delegado Vicente, também foi preso. No dispositivo de ambos, à polícia encontrou, conversas, e um acordo entre eles.
Na sede da PF, os interrogatórios começaram. Documentos, extratos bancários, áudios comprometedores, filmagens, inclusive de Lavínia com Leonardo, tudo estava ali, nas mãos dos investigadores. A promotora fora pega em sua própria rede de intrigas.
O responsável por esse golpe fatal? Tom. O amigo de Fernando, que encontrara no dispositivo de Leonardo a ruína de Eleonora.
Sem que a própria mãe percebesse, Leonardo, em vida, havia invadido seu celular e armazenado tudo em seu dispositivo.
E agora, mesmo morto, Leonardo Farias derrubava sua própria mãe do pedestal. A rainha caíra. E ninguém parecia disposto a salvá-la.
Uma semana depois, a segunda bomba explodiu nos noticiários.
As manchetes ecoavam por todos os canais de TV, rádio e internet: “Dossiê Revela Crimes de Hugo Reis! Empresário Foragido!”.
As provas eram esmagadoras. Corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, venda de sentenças judiciais, e o mais chocante: envolvimento no tráfico de cri..anças e ped..filia.
O país ficou perplexo. O império de Hugo Reis desmoronava diante dos olhos do país inteiro. A PF cumpriu mandados de busca e apreensão em suas empresas, mansões e contas bancárias.
Tudo estava sendo investigado. Mas Hugo… Hugo havia desaparecido. Ele limpou suas contas bancárias. Ninguém sabia seu paradeiro.
O responsável por esse vazamento? Tom. O especialista em TI, amigo fiel de Fernando, usou o dispositivo de Leonardo para vazar todo o conteúdo que o jovem havia hackeado do próprio pai: documentos, conversas, transações ilegais, acordos milionários, vídeos com meno..res. Tudo estava ali, nas mãos da polícia e da imprensa.
No dia em que Eleonora foi presa, ele se antecipou, vendeu suas empresas e bens. Pegou um jatinho particular e sumiu do mapa. Mas, para onde? Ninguém sabia.
Enquanto isso, muitos políticos, juízes e empresários negavam qualquer envolvimento. Alguns fingiam surpresa; outros temiam ser os próximos a cair.
No meio de tudo isso, Eleonora assistia às notícias da cela onde estava detida. Seus olhos queimavam de ódio. Não por Hugo estar caindo, mas por alguém misterioso ter conseguido acesso a tudo.
A promotora não sabia que Leonardo, seu próprio filho, havia sido o causador de sua ruína e na ruína de Hugo.
A pedido de Fernando, Tom usou o dispositivo de Leonardo para chantagear a diretora Mônica, do Colégio Horizonte do Saber.
Leonardo, antes de ser assassinado, havia invadido o celular de quase todo mundo daquele colégio. E no celular da diretora, havia conteúdo erótico: vídeos, fotos, áudios, além de conversas entre ela e o professor João Pedro, de história. Eles eram amantes há pelo menos cinco anos.
Diante das evidências. Mônica cedeu à chantagem. Fernando não voltou para o colégio apenas como professor de educação física, mas como vice-diretor, com Nicolle, sua irmã, como sua secretária.
Os irmãos continuaram se relacionando secretamente, enquanto Fernando consolidava seu poder na instituição de ensino.
Após uma onda de escândalos e reviravoltas, a vida na cidade de Betim foi, lentamente, retomando sua rotina habitual.
Miguel e Solange voltaram a ser amantes, em encontros repletos de sexo, gemidos, culpa e desejos. Lavínia e Felipe assumiram um relacionamento secreto e, determinada, Lavínia planejava engravidar do aluno, sem que ele desconfiasse de suas reais intenções.
Atílio, esposo de Lavínia, continuava impotente e corno, preso a uma mulher que não o deseja.
A justiça alcançou Eleonora, que perdeu seu cargo, sendo sentenciada a oito anos de prisão domiciliar. Ela foi embora de Betim e retornou ao Rio de Janeiro. Sozinha e traída pelo próprio filho, sua carreira, sua influência, terminou em ruínas.
Já Alessandra e Caroline, essas, deram a volta por cima. Hugo, apaixonado por Caroline, fez uma proposta irresistível a ambas: elas poderiam viver ao seu lado nas Bahamas, em uma mansão luxuosa, cercada por segurança, mordomias e longe de Betim e de todos os fantasmas do passado. E elas aceitaram a oferta, iniciando uma nova vida ao lado do magnata foragido.
Hugo adotou Caroline como sua filha legítima e se casou com Alessandra. Porém, ele transa diariamente com as duas.
Enquanto isso, Tom aproveitava seu poder. Com acesso ao vasto material do celular de Leonardo, não se limitou a chantagear Mônica. Ele se tornou o predador no Colégio Horizonte do Saber.
Tom e Fernando, eles usaram informações comprometedoras para manipular e chantagear Lavínia, Solange e muitas outras professoras e alunas do colégio, como a Jéssica: que Leonardo também invadiu seu dispositivo móvel. A dupla, usou a garota para fins sexuais e também a prostituiu, a oferecendo aos mais ricos e influentes da região.
Assim como Leonardo, a ascensão dos amigos, não tinha limites e o medo agora era sua principal moeda de troca.
O que um dia começou como uma brincadeira, transformou-se em um jogo sujo de poder e manipulação.
No final, a verdade não era sobre chantagem, mas sobre quem tinha as cartas mais fortes nas mangas.
Fim.