Por dentro das redomas de Santa Clara de Assis
É extenso, é profano, é santo e sacrílego. Aos que têm um sensível coração religioso, advirto-os que não prossigam nesta leitura. Aos que esperam linguagem vulgar e pura baixaria, esta leitura também não é para vocês. Aos que são livres de espírito e curiosos em essência, que apreciam conhecer o que poucos conhecem, esse relato é para vocês. E se não houver uma alma que se encaixe nessas características, dedico este relato às areias do tempo e conexões da nuvem que é eterna. E por fim, ao esquecimento. Destino de todos nós, efêmeros.
Este relato vai ser contado apenas por um motivo: ninguém do meu ciclo social sabe do ocorrido, era um segredo guardado a sete chaves antes de eu contar por cima no chat, impossível de me rastrear, e impossível de rastrear e prejudicar a reputação e vida religiosa de minha colega que vivenciou esse momento junto comigo. Sinto-me deveras orgulhosa por ter vivido algo que acredito eu que poucos tenham tido o mesmo prazer de vivenciar fora de suas fantasias.
As meninas que, como eu, são tal qual lâmina de navalha sabem que o jogo de sedução é completamente diferente quando estamos lidando com o mesmo sexo, o interesse não costuma vir acompanhado de um tesão repentino, o sangue não efervesce, ele é aquecido a banho-maria. A tensão é grande, e a dúvida ainda maior – Será que ela sente o mesmo que eu?
Foi assim comigo e a Irmã Maria Isabel do Sagrado Coração de Jesus, Irmã Isabel para os íntimos – nome religioso da Viviane, da ordem das clarissas. Por se tratar de uma religiosa em vida de clausura, ela saía do convento apenas de dois em dois anos para votar ou quando iam todas elas para uma consulta médica de rotina, mas elas podiam receber visitas em horários pré-estabelecidos, intervalos onde as jovens beatas (eu inclusa) iam para lá receber conselhos religiosos das mesmas e serem encorajadas a serem enclausuradas também.
Para explicar como isso foi possível, eis um parágrafo introdutório ao mundo das beatices: As freiras podiam atuar como uma espécie de “diretora espiritual”, onde apadrinhavam meninas e mulheres e rezavam por elas como se fossem sua responsabilidade, e podiam também ter conversas privadas dentro das cabines próprias para tal atividade. Que registre-se: havia sempre uma grade entre as freiras e os visitantes, mesmo nas cabines particulares. Ocorre que nesse convento em particular, havia retiros espirituais onde se admitia a presença de profanas por alguns dias dentro das grades, para entrarmos em comunhão com Jesus, vivendo por alguns dias uma vida monástica. A ala destinada a retiros era um corredor de celas, e as celas das noviças e freiras era em outro corredor.
A Irmã Isabel foi responsável por ser minha diretora espiritual, e sempre me dava conselhos piedosos em nossas conversas particulares, sobre como o demônio entrava pelas brechas que abríamos em nossas vidas, sobre como a oração nos protegia desses ataques, e sobre o amor de Cristo para conosco, com a promessa de uma vida futura plena na presença de Deus.
Ela me indicava sempre o terço de São Miguel Arcanjo, e em nossas horas particulares (marcada a relógio, como tudo na vida monástica) sempre rezávamos juntas essa oração. Mas como todos bem sabem... Satanás é astuto, e eu seria o instrumento dele para trazer à Irmã Isabel seus demônios da adolescência para dentro daquelas grades.
Com o tempo, fomos ficando mais íntimas. E aos poucos, a Irmã Isabel deixava sua curiosidade ultrapassar as regras daqueles encontros, entrando em um assunto que freira não toca, os pecados do passado, e ela sempre ressaltava o quão lindo era Jesus ter me resgatado de uma curta vida pecaminosa, e dizia sempre que rezaria mais e mais para que eu alcançasse a santidade. Ela ia ficando curiosa e ia perguntando como eu me sentia, como era, e claramente deixava sua curiosidade a corromper pouco a pouco. E não era para menos, afinal a única coisa que a coitada fazia era rezar, fazer velas e panos de pratos, serviços domésticos do convento e rezar mais. Então a vida profana foi tomando conta da sua cabeça... Desse modo, um dia ela se abriu comigo e fez pior, contou que ela também havia sido uma pecadora, e que tinha optado pela vida religiosa para purgar seus pecados e reparar suas “más ações”, a exemplo de Santo Agostinho.
A Irmã Isabel a este ponto já quebrava todas as regras, falando do meu passado e do seu também, e os assuntos religiosos e orações já não tinham mais tanto espaço em nossas conversas. Seus conselhos? Não havia mais tempo para isso na uma hora cronometrada desses encontros. E eu notava sua expressão de dúvida e insatisfação quando retornava à clausura.
Pouco se via de seu corpo naquele hábito pesado de freira enclausurada, nem ao menos a cor de seus cabelos tonsurados era visível. Mas eu fui cativando um sentimento diferente, não pela Irmã Isabel, mas sim pela Viviane – mais uma falta, revelando-me seu nome verdadeiro e mostrando-me que a Viviane não estava morta, mas sim encarcerada dentro da Irmã Isabel do Sagrado Coração de Jesus. Ela tinha apenas 26 anos, dez a mais que eu, e estava ali dentro desde os 21, faltando apenas 2 anos para fazer seus votos perpétuos.
E sim, eu sentia-me uma terrível pecadora por nutrir desejos por uma freira enclausurada. Mas eu notava sua recíproca, e isso foi ficando cada vez mais claro, chegando ao ponto de ela começar a colocar as costeletas do seu cabelo – curtinho devido à tonsura obrigatória – para fora do hábito, revelando cabelos castanhos acobreados que combinavam perfeitamente com sua pele branca naturalmente corada nas bochechas.
A tensão era muito grande naquele ambiente, mas eu continuava indo ao convento com uma outra beata jovem da igreja semanalmente, esta que também era dirigida por uma freira, uma senhorinha já com seus 67 anos. - Essa sim! Só dava conselhos católicos e santos! – Era nítido o aprofundamento desta outra na religião e santidade após a direção espiritual desta freira idosa. E quando ela me perguntava sobre como ia indo eu com a minha diretora espiritual, eu inventava leituras e terços. Eu sabia que era errado, eu sentia a culpa... Mas eu estava viciada na Irmã Isabel e na Viviane. E mesmo assim, nunca pensei na possibilidade de acontecer algo – porém, repito... Satanás é astuto.
Um dia, a madre superiora convidou-me junto a esta outra beata para participarmos do retiro semestral dentro da clausura, só haviam dez vagas, pois dez eram as celas feitas para este fim. Então era algo seleto, apenas para as mais religiosas dentre as que eram dirigidas pelas freiras, e a madre enganou-se terrivelmente ao me colocar para dentro daquele santo convento. Seriam três dias e duas noites ali dentro, como os dias que Cristo passou morto.
Entrei ali na sexta-feira, e a rotina era oração e mais oração, junto a ensinamentos dados pelas freiras sobre a vida de oração, e, claro, missa diária. – Sim, também era um período especial para elas, onde a rotina mudava e elas tinham atividades diferentes.
Como eu me sentia ali dentro? Ensandecida, dividida entre o retiro e a intensa troca de olhares com a Viviane. Ninguém percebia, pois todos estavam enfeitiçados pelo ar de ingenuidade do convento, incluindo as outras freiras que não viam maldade alguma em nada.
Já dentro da cela à noite deveríamos rezar em solidão e ajoelhadas um rosário de frente à imagem de Jesus Crucificado, e eu estava lá cumprindo a ordem da madre superiora e sua programação do retiro. De joelhos, com um rosário em mão, apenas escuto a maçaneta da porta girar, não tinha ouvido passo algum no corredor.
Viro-me assustada e observo estarrecida: Viviane com a camisola padrão de freira, longa e branca, sem o hábito pesado, entrando, fechando a porta e colocando seu dedo indicador na sua boca, fazendo gesto de silêncio.
Eu estava surpresa, mas a visão que tive foi linda: uma mulher com cabelos curtinhos, cortados de qualquer jeito (a tonsura), branca que nem leite, um corpo mais cheio, cheia de curvas e seios volumosos. O hábito cobria uma mulher lindíssima, a Viviane sim era como um anjo.
- Irmã Isabel... – travei, não sabia o que dizer, eu sabia o que aquilo significava.
- Se não for hoje não será nunca. – ela me respondeu.
O beijo foi ardente, mas suave. Eu sentia a excitação dela, eu sentia a respiração de quem há muito não sentia outro toque em seu corpo. Aquilo ascendeu meu instinto de dominadora com as mulheres, o oposto do que sou com os homens. Eu fui envolvida pelo calor do momento, sabia que meu corpo daria um prazer que ela não tinha há muito, e que se continuasse ali dentro talvez nunca mais fosse ter.
A cena era sublime, aquilo não era sexo carnal, eu tinha um ser que exalava pureza nas minhas mãos. – Sim, essa era impressão que dava devido ao ambiente em que estávamos. Era um convento! Quem que em pleno senso de si mesmo profana um convento dessa maneira? Eu! Eu e a Viviane! Eu e a Irmã Isabel! – E eu fiz esse momento único ser divino, como ela merecia...
Eu comecei a tocá-la por cima da camisola ainda, aumentando a intensidade dos beijos, e levando uma de minhas mãos de sua nuca até quase chegar nas nádegas, sem tocar lá. - Tudo num extremo cuidado e mais profundo silêncio, ninguém poderia sonhar com aquilo. – Ela também me acariciava os cabelos. Mas ali, quem dominaria seria eu. Por isso ousei e toquei nos seios dela, bem devagar – como gosto que façam comigo -, em movimentos suaves e calmos.
A evolução foi rápida, ela tirou sua camisola, e eu a minha. E ficamos ali, mãos nos seios uma da outra, beijos de língua demorados. Me ajoelhei em sua frente e coloquei seus seios na boca, sempre suave, buscando dar o máximo de prazer possível, aumentando a intensidade e depois descendo pela sua barriga, esfregando meu nariz em sua calcinha e lambendo-lhe a virilha.
Ela me puxa para cima e tenta vir por cima de mim me deixando na cama dura, de colchão fino (de penitência), da cela. Mas aquilo não seria assim, logo inverto a posição e vou por cima dela, puxando sua calcinha e lhe tocando com as mãos enquanto beijava seu pescoço e sentia ela se contorcendo naquela cama minúscula. A lubrificação daquela mulher estava em níveis absurdos, deixando meus dedos completamente ensopados enquanto eu dedilhava seu clitóris e de vez em quando ameaçava introduzir um dedo, mas apenas passava o polegar na entrada.
Com minha mão livre, segurei sua boca para que não houvesse risco de sair um gemido dali, e com a outra, introduzi um dedo e depois dois. Tiro os dedos, tiro minha mão de sua boca e pego na sua e coloco ela mesma para segurar seus barulhos, dando mais umas acariciadas em seus seios com a boca e descendo até a fonte de onde saía toda aquela lubrificação, todo aquele líquido delicioso.
Bastou uns poucos beijos de língua em seu clitóris e uns poucos movimentos com a língua, quando recoloquei os dedos, comecei a sentir as contrações mais fortes de seu canal vaginal que era bem apertado – talvez devido ao tempo sem usar – e vi a bela cena de Viviane se contorcendo e segurando bem a própria boca para não emitir sons naquele orgasmo que aparentou ser deveras intenso.
Claro que após isso ela me retribuiu aquele carinho íntimo, e eu também gozei deliciosamente em suas mãos e bocas, que apesar do tempo de clausura demonstravam ainda habilidade instintiva e experiência. Ela era antiga nesse pecado da homossexualidade!
Foi uma noite digna das noites mitológicas da Ilha de Lesbos, na antiga Grécia de prazeres e mistérios. Mas dessa vez, um rito sacrílego nas redomas de Santa Clara de Assis. Repetimos o rito ainda algumas vezes naquela noite, e já era madrugada quando ela voltou à sua cela.
No dia seguinte, a rotina começava cedo, para as freiras às quatro e meia da madrugada, e para as meninas do retiro às seis da manhã. Eu estava exausta e com um sentimento de culpa que logo era desfeito pelas lembranças do prazer. Mas a Viviane... Estava novamente presa na Irmã Isabel, que evitava me encarar. À noite, já não a esperava, pois havia me evitado o dia inteiro. E fui embora sem ao menos ela me dizer uma palavra. Mas eu sabia que meu gosto estava em sua boca, e meus cheiros em sua vestimenta religiosa do sono, assim como os gostos e cheiros dela estavam em mim.
Quando voltei ao convento e a procurei, ela me recebeu, mas foi logo falando que não poderia mais ser minha diretora espiritual depois do ocorrido, que o que aconteceu tinha sido influência maligna dentro dela e que ela estava se sentindo muito mal por isso. Não discuti, não falei nada. Nem ao menos me despedi propriamente, devido às grades. Não sei se ela chegou a comentar isso em alguma confissão, mas creio que não para não perder o hábito. E quanto à culpa... bem, hoje não tenho mais nenhuma. E quanto à Viviane-Irmã Isabel... não sei de nada. Apenas não voltei mais ao convento, por já estar começando a ver que eu não tinha vocação nenhuma para a beatice.