Eu aceitei porque foi a forma mais fácil de eu encontrar a felicidade para o Gabriel e para minha família, só sabe quem passou por algo parecido... Eu aceitei por que eu amo muito as pessoas que se beneficiariam com esse meu sacrifício, e por eles eu faria qualquer coisa.
- Então é muito simples - Disse o André – Eu pago a divida do Gabriel, afinal ele não quer mais problemas em casa não é mesmo? Basicamente é só isso.
- Mas e o emprego do meu pai? Perguntei.
- A esse ai eu ia conseguir de qualquer jeito, já tinha falado com eles sobre isso. Era por isso que eles estavam tão felizes.
Eu fiquei absorto, não poderia ser. Como o André estava fazendo isso comigo?
Ele continuou:
- Sim, sim, eu já tinha dito aos seus pais que iria conseguir um emprego muito bom na empresa para eles, e que eles não precisariam mais do velho emprego. Com ambos trabalhando no cargo que lhe confiarei ganharão até um pouco a mais do que já ganhavam. A divida com o Gabriel eu vou pagar, não se preocupe. Dar-te-ei o dinheiro suficiente para quitar a divida do seu “ex amor”. E em troca você namora comigo, para sempre!
- E se eu não quiser mais? E se eu não aceitar a proposta? Perguntei.
- Não é possível que você faça isso, afinal, eu diria aos seus pais que você é gay. E com o pai que você tem, sua vida não ia se tornar algo melhor do que é agora, não é mesmo meu amor?
Eu estava atônito. Não conseguia falar, minha mente era um turbilhão de pensamentos. Agora eu simplesmente não poderia voltar atrás. As conseqüências seriam piores. Naquele momento eu odiei o André mais do que tudo. Se eu tivesse um raio laser nos olhos com certeza o André estaria só o pó naquele momento, mas eu não tinha armas contra as chantagens dele.
- Já te disse Pedrinho, menininhos não choram. Agora vá para casa. Te deixarei lá.
Andei até a porta da casa do André. Ladeando a porta havia duas estatuetas representando anjos de gesso. Uma fúria calorosa me impulsionou a pegar uma das estatuas e arremessar contra uma das paredes da sala. O baque forte do bater da porta foi inaudível diante da barulheira produzida pelo quebrar da estatua. Eu já estava lá fora. E ia para casa só, caminhando só.
No caminho o André me mandou mensagens dizendo que não era para contar nada a ninguém. Para quem soubesse que eu era gay deveria apresentar o André como um namorado amado. Apenas isso. Para as outras pessoas deveríamos ser o melhor casal do mundo. Eu sabia que daqui para frente tudo ia mudar. Liguei para o André, ainda andando na rua.
- Eu quero te pedir um favor. Implorei.
- Peça meu amor, eu daria a lua por você. Só não posso te perder, se o seu desejo for de que eu não te tenha mais nem tente.
- Ridículo você! – exclamei – eu queria passar um ultimo fim de semana com o Gabriel, um ultimo fim de semana juntos (era sexta feira). Falei como um faminto no deserto que pede um milagre a um Deus.
Ouve um silencio, e depois a voz do André, que disse:
- Qual foi o adjetivo que você usou?
- Como? Disse eu sem entender.
- Você me chamou do quê?
- “Ridículo” Não é isso que você é? Eu estava com muita raiva.
- Por favor, use algo mais carinho, talvez assim eu pense em te ajudar nesse final de semana.
Juntei todas as forças do mundo para usar uma palavra carinhosa com André naquele momento, afinal era meu final de semana (o ultimo) com o Gabriel que estava em jogo, falei:
- Por fa-vor... me...u... a... mo... r...
- Não entendi direito? Poderia repetir?
- Porfavormeuamor. Falei rápido.
- Devagar, por favor.
Eu não acreditava que aquilo estava acontecendo, juntei ainda mais forças não sei nem de onde e disse calmamente e de forma bastante audível:
- Por favor meu amor.
- Agora sim – disse ele – tudo bem, eu deixo. Para onde vocês vão?
- Ainda não sei!
- Pois quando você souber me diga ta? Até mais meu amor.
Desliguei o telefone. Agora era rezar para o André não mudar de ideia.
Eu chorei durante todo o caminho de volta para casa.
Quando eu cheguei em casa estavam todos muito felizes, meus pais tinham chamados alguns amigos íntimos deles para comemorar o novo emprego. Parece que muitos funcionários que (por incrível que pareça) adoravam meu pai tinham se demitido quando souberam que seu sócio majoritário tinha lhe tirado a empresa. Eles arranjaram outros empregos facilmente, afinal todos tinha grande experiência no que faziam, e parece que a empresa estava carente de funcionários com a mesma qualificação profissional que os antigos. Meu pai agradecia a todos.
Tive que participar da festa a força. Estava tão triste... Mesmo assim não poderia demonstrar tristeza, não diante da alegria do meu pai e da minha mãe. Tentei esquecer o que acabara de acontecer, mas era impossível. Todos estavam felizes e alegres. Por fora eu também tinha conseguido demonstrar que estava feliz (já fiz teatro), mas por dentro eu estava triste e amargo, e queria chorar ao invés de sorrir. Quanto mais a festa durava mais eu me sentia triste, e mais eu me via na obrigação de parecer feliz.
As pessoas conversavam comigo, sorriam para mim. Perguntavam sempre ao meu pai se eu era seu filho, mas estava na cara, eu era extremamente parecido com meu pai. Bebi “para esquecer meus problemas”, acabei meio que entrando no clima da festa, mas lá no fundinho eu ainda estava muito triste pelo que tinha acontecido. Era como um fogo que me corroía por dentro.
Finalmente a festa acabou. Todos foram para suas casas, e eu fui para o meu quarto, painho e mainha tinham ido comemorar a noite em outro lugar, eu estava só naquele apartamento que agora parecia ainda mais vazio com a saída de tantas pessoas. Eu sentei num cantinho entre a sala e a cozinha e comecei a chorar. Chorei compulsivamente. Quem disse que meninos não choram?
- Oi meu amor – Disse eu ao Gabriel no telefone – você está com o final de semana livre?
- Oi Pedro. Passei esse tempo todinho pensando em você. Estou sim com o final de semana livre pow. Que marcar alguma coisa?
- Sim – falei meio triste – vamos para uma praia ai...
- Minha família tem uma casa de praia em Genipabu – propôs - quem sabe se eu dizer a mãe que vai Eu, você e uma galerinha amiga sua, ela não libera a chave da casa?
- Fale com ai com ela...
Ouve um silêncio e depois a voz do Gabriel:
- Pedro mãe deixou! – gargalhou - passarei ai na sua casa tá?
Desliguei o telefone e comecei a chorar. Seria meu ultimo final de semana com o Gabriel.
Eram 12:00 André tinha vindo em minha casa. Disse que era para eu estar aqui na noite de domingo, disse que era para eu lhe informar exatamente onde era a casa onde eu iria ficar, e “para eu tomar cuidado”... Me deu um beijo na boca, eu não mexia o lábio e pus a língua lá pra dentro. Foi o pior beijo da minha vida. André se desvencilhou do beijo, disse que eu me acostumaria com ele. Quando o André já estava de saída entra o Gabriel.
- Olá André. Diz um Gabriel meio desconfiado.
- Opa cara, beleza. Tava aqui na casa do Pedro para dizer-lhe que consegui um emprego para seu pai e sua mãe.
- Nossa cara, que massa. Você realmente é um grande amigo do Pedro! Gabriel o abraçou carinhosamente. O pobre não sabia o que estava fazendo.
- Que nada – Disse André depois do abraço - o Pedro nem me considera tanto assim... Olhou para mim e deu uma piscadela.
Continua...
